segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Monangambeeeeeeeê


A criança que eu fui, foi muito feliz.
Brincava no meu quintal e nos dos vizinhos.
Na rua, no bairro. Muitas vezes descalça, com outras e outros.
Miúdos iguais a mim.
Fomos criados com uma certa liberdade de movimentos e atitudes.
Aprendiamos tudo o que havia para aprender e que assimilávamos.
De bom e de mau.
As asneiras, os gestos asneirentos, a implicância com quem preconceituosamente definiamos que era inferior.
E havia...nas nossas cabeças.
Havia um grupo de homens, quase sempre negros, empoleirados nos carros da Câmara Municipal, cujo trabalho era, deitar água, como se fosse um regador, pelas ruas de Luanda. As que não tinham asfalto.
Havia também os do carro do lixo.
E os da carroça dos cães ( que eu odiava de morte ).
E ainda os que passavam em camiões, nas carroçarias dos mesmos. Todos perfiladinhos, como estes que estão na foto.
Estes homens eram uma tentação para o nosso espírito maligno.
Como foi quando estive em Angola e seguia atrás deste camião.
Apeteceu-me, fazer o mesmo que faziamos, naquela época.
MONANGAMBÊ!MO-NAN-GAM-BEEEEEÉ!
TU VAIS DE CARRO E EU VOU A PÉ...
Naquele tempo, os monangambês ofendiam-se tanto que acto imediato, nos brindavam com um chorrilho de palavrões, qual deles o mais cabeludo.
Mas o nosso gozo de crianças criadas em África, na rua, por nossa conta, era tanto, que só para os ouvirmos dizerem as asneiras, cruelmente repetiamos vezes sem conta, a provocação. Os mais velhos ou os que sabiam assobiar faziam a entoação própria que dávamos às palavras e os pobres " monangambas " reagiam de igual forma.
No dia em que este camião rolava à minha frente, apenas tirei a foto, uma maldade mais pequenina, mas igualmente gozada, como se fora a miúda travessa daquele tempo distante.
Monangamba, quer dizer, contratado.
Muito mal tratado pelos brancos colonos.
Iam trabalhar para o mato, para as roças de café, a troco de muito pouco.
Quase escravos.
Era uma grande humilhação, uma ofensa, nos tempos que corriam, talvez início dos anos 60,para estes homens que trabalhavam na cidade, alguns camarários até, serem chamados de manangambés.
Felismente esse tempo já lá vai.

1 comentário:

anónimo disse...

Fui desses.Dos que gritavam por monangambé aos homens do lixo, por exemplo, e assobiava para completar a proviocação. Bons tempos.