quarta-feira, 30 de setembro de 2015

um dia

Sou um barco de papel,
atracado no cais deste desencanto.
Meu. 
E de todos os barcos frágeis e brancos, 
presos nas amarras do desalento.
Um dia, 
solto as velas e vou. 
Enfrentar dragões da história.
Perseguir sonhos,
mil,
que eu própria espalhei ao vento.
Um dia,
o mar será minha morada. 
Estrada,
onde caminharei pelo meu pé,
sem âncoras nem asas.
Nem nada...
Um dia, 
serei feliz.

m.c.s.

terça-feira, 22 de setembro de 2015

a minha posse

Ganhei-me. 
Quando aos poucos fui perdendo riquezas. 
Vantagens. Beleza. Viagens. Certezas.
Herdei-me.
Quando olhei para o lado e só lá estava eu.
E vi-me. No espelho inimigo. Na sombra. E no perigo.
E li-me. E reconheci-me. No livro. 
Na história que me narrou. E crucificou. 
Naquele testamento, que me contemplou.
E muito doeu. 
Na falta do que me pertenceu.
Sou minha. Muito minha. Sempre minha. 
Porque não pertenço a ninguém. E não mais me dei. 
Sou pertença herdada desde que abandonada à minha sorte fiquei.
Ganhei-me. 
E essa posse foi lavrada e lacrada em real escritura.
Reconhecida que foi a minha desventura. 
Mas... sou minha. No tudo e nada que me herdei. 
Herança que me protege, alimenta e me sustenta com doce e justa bravura. 
Porque me amo e amarei.

m.c.s.

noite de sábado em Cascais

É tão bom!
O mar que nem sempre é azul.
Os sonhos que podem não ser a rosa.
A noite que ainda não está fria.
O encontro com os elementos que não tem dia nem hora.
A amizade, que me traz até aqui. 
A foto que exige nascer. Marcar. Para hoje recordar o ontem.

apátrida

Sem Amor sou um apátrida no sentimento.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

tatuando

Toca-me a maciez do gesto
isolado,
único, 
de raros dias de bonança
Na alma leve
Afagos breves
Tementes e caros
Na mente, a letargia
Na pele, doce acalmia
Acenos 
À despressa da mudança...

Há na fé que vem de ontem 
Um coração antigo, que se aquieta 
Ao toque duma intenção
À memória dessa mão
Quente e macia
Ao sorriso que me ficou
Quando o amor me beijou

Morre-me no peito o verão
Vai-se embora a andorinha
Mas não! 
Não me deixa sozinha...
Porque o gesto me nasceu
E me chamou
A tatuar-me d' emoção
Não! 
O amor não terminou...

m.c.s.

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

amar

No beijo que a gente dá; e no apertado abraço, infinito laço - o Amor está lá.
E não importa se se ausentou do nosso presente. 
Se nos beijou e abraçou no passado. 
Importa sim, não pôr um ponto final. 
Não dizer adeus para sempre. Ao amor.
Por isso reticencio os sentimentos, não me apagando de quem amei. 
De quem amo. 
Não me perdendo do amor. Fixando-me no horizonte. 
Porque nos dias que hão-de chegar, vejo espaço real para amar.
O amor conjuga-se em todas as formas verbais. Ele existe verbalizado inequivocamente. 
AMAR... 
Eu amara. 
Eu amava, eu amei. 
Se eu amasse, eu amaria. Eu tinha amado.
Eu amo, eu amarei. 
Quando eu amar. Que eu ame. Amando. 
Por amar eu. Amemos nós. Amado... 
No beijo que a gente dá; e no apertado abraço, infinito laço - o Amor está lá.

m.c.s.

amputação

De que me serve ser endeusada? 
E ser chamada de amor se me amputarem os braços com que hei-de abraçar?
Não quero ser deusa. 
Amor e beleza.
E ficar num pedestal.
Não quero perder a força. E o vazio apertar.
Não quero fazer parte da história.
O que eu quero afinal é que nunca me faltem braços para o amor eu enlaçar...

m.c.s.

intervalando-me


As férias são intervalos da vida. Resgates. De felicidade.
No mais, é a construção dessa felicidade, fundamental, para os restantes dias. 

m.c.s.

pensamentando-me

Para sabermos da Alegria precisamos sentir a Tristeza...
Todas as estações têm o seu encanto, quando o coração se encanta.

m.c.s.

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

pedinte...mas pouco

Ontem, já noite, ali para os lados de Entre-Campos, acompanhei uma amiga a uma consulta - é habitual ; curto acompanhar doentes, sei lá, à falta de melhor, sempre vou para o aconchego duma sala de espera, respirar o mesmo ar que os doentes respiram e saber novidades da vida, fora das minhas quatro linhas, porque para lá das paredes do meu kimbo existem vidas e eu sou cusca de vidas alheias, sobretudo se doentes e fragilizadas, a precisarem, a bem dizer - mas como queria contar, estando eu sentada na sala da entrada ( há outra ) onde a assistente de consultório, senhora muito simpática e eficiente, admite doentes, cumprindo na perfeição a sua função, a conversa surge. Acho que ela tem grande simpatia por doentes africanas ( caem lá como tordos ). Até parece ser uma de nós. Porque deixemo-nos de tangas. Não somos melhores. Somos só mais escuras, algumas, de cabelos encarapinhados, com outros hábitos e costumes, quase sempre de taxa arreganhada e jogando problemas p'ra trás das costas conferindo-nos um cunho só mais optimista e colorido. Inconsequente. Não digo que ali no consultório as africanas se riam às gargalhadas, exibam os seus telemóveis topo de gama, as griffes, mandem postas de pescada por tudo e por nada sobre as suas ociosas vidas para impressionarem não só as tugas, mas também as compatriotas menos sortudas, até porque seria desadequado, pois quem tem cu tem medo e perante uma bata branca, os sintomas incomodam e fazem tremer; não digo que ali não entrem apenas as africanas mais normais e parecidas com as europeias. E talvez por isso ache a assistente, uma das nossas. Aculturada. 
E, porque, à minha amiga já a conhece há décadas e a mim desde a reforma, as conversas surgem e sendo como as cerejas fluem e andam de mão em mão. As nossas, claro, porque à hora que lá esperamos já as senhorecas desta ervilha, querem é ver novelas, no sofá da sala, esquecendo doenças que as afligem perante os chefes, durante o dia; e na cama, perante os maridos.
E dumas para outras, a senhora assistente, que até parece uma de nós, acaba naquela troca de trocos, dinheiro mais que trocado, moedas pretas, escárnio e maldizer, a contar que um dia destes, há bem pouco tempo, estando numa esplanada com uma amiga, se lhes abeirou um pedinte. Dos nossos. Aqueles a quem chamamos pobre, sem-abrigo, mendigo, quando não chamamos, drogado, arrumador, larápio ou sarnoso. Que lhes disse ter fome; que queria uma moeda. A assistente da doutora logo lhe deu uma moeda de um euro para as mãos, enquanto a amiga procurou e achou uma moeda de cinquenta cêntimos e algumas moedas pretas de valor inferior, entregando-as. Acto imediato, a criatura, a tal que vai sendo baptizada conforme o cidadão a vê, olha as moedas, escolhe as menos valiosas e atirando-as literalmente à cara da benfeitora diz - P' ra que é que eu quero moedas pretas? Não servem p' ra nada.
E perante a surpresa indignada de todos os presentes, vai embora com o rei na barriga, arrecadando em menos d' um fósforo um euro e mais cinquenta cêntimos, desprezando as restantes. Desprezando as suas benfeitoras. Desprezando-se...
Nem sequer me indignei com a história. Afinal é o que temos. O que a casa gasta. Mas, perante o insólito da cena eu reforcei a minha teoria. Muito minha e quem quiser que a deite fora. 
Só dou esmola aos " nossos " pedintes cegos. Esses pelo menos não vêm a cor da contribuição.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

na Graça - Lisboa


exposição TAP no MUDE






no Cruzes Credo - Na Sé


karma


Nem todos os dias são destino
Nem todos os destinos são fatais
Nem todas as fatalidades permanecem
Nem todas as penas se repetem

Nem sempre a lágrima chora
Nem sempre o sorriso demora
Nem sempre o sol se esconde
Nem sempre o amor mora longe...

Sou o karma deste dia
Querendo a sina mudar
Os dias só serão destino
Se neles me acorrentar

Sou um apelo à memória
À fé e ao que quero ser
Recrio-me a cada história
No sonho de me renascer

m.c.s.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Entre a Mouraria e a Graça


ainda tento

Quando a brisa sopra, vou no embalo. 
E na maré. 
De feição.
Quando a tempestade se impõe, saio da proa e enfrento. 
E porque nem sempre nem nunca, às vezes, marcha-à-ré. 
Mas a vida já não está para recuos. 
Nem se compadece ou faz fretes. 
Por isso eu vou, ao sabor do vento. 
Ainda tento. Ainda tento...
Enquanto recuo ou avanço, ganho estrada. 
Paciência. 
Ganho tempo. 
Sapiência...

m.c.s.

desmaquilhada

Visto-me de amanhãs, se a saudade me acorda nua e desmaquilhada.
De cara lavada.

m.c.s.

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

eu

O sorriso de sô Santos. Tal e qual.
Sábado. Almoçando com as duas pessoas mais lindas do universo.

pensamentando-me

Morar na esquina da minha casa, é não desistir de sentar comigo no muro.

m.c.s.

o Amor

A trepadeira conquista. 
Ocupa 
e abraça. 
Permanece...

Assim é o amor a fazer-se forte, desde que nasce. 

Enraíza-se, 
cresce 
e imortaliza-se.

Queria ser uma trepadeira!

m.c.s.

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

horizontes

No silêncio do gesto
Aos passos que me dou solitariamente,
( caminhante d' hora certas e vagas
no topo da fila deserta, aberta à minha vontade )
Não esmoreço...
Há distância
Há saudade
Abraços perdidos
Caídos
Sonhos pisados 
E visões de eternidades...
Há vazios
E lábios cerrados
Mãos que não acariciam
Nem batem palmas à passagem...
Quebro as promessas de viagens
Quedas e mudas
E invento novas estradas
Recomeço-as...
No silêncios dos deuses
Exaltam sentidos adormecidos
Em cânticos de louvor
Só eu os oiço 
Linguagem do amor

m.c.s.

serão d' amigas

Com o quinto livro de crónicas de Lobo Antunes ( não fosse sacrilégio e lhe chamaria bíblia ) d' um lado e uma gata d' outro, o rádio despertador numa estação qualquer ao acaso, ligo a luz do candeeiro que apagara não faz muito tempo. E olho-me ao espelho. Bocejo atrás de bocejo, me fez o corpo deitar. O adiantado da hora também pesou, talvez indo ao encontro dos mais novos que em repetição enervante me dizem ter de repousar.
De vez em quando finjo insónias por não me apetecer dormir. Por não o querer, este espírito inquieto e ávido. Em conflito com os fins dos dias. Com os fins dos ciclos. 
Pois que bastaram tantos anos de trabalho com regras e horas fixas. Relógios e calendários. Obrigações e sujeições. Atropelos e tropeções no sono. 
Hoje quando o bocejo chega entediante e ensonado e me encontra tão embrenhada na vida, ( interior ) não o valido. Até que o cansaço vença a vontade de sentir o bom senso que nesta idade nos ganha. Lúcidos que nos tornamos.
A vida e os seus filtros; as suas renúncias; a sua beleza; a vida na sua essência e o seu fim, foram a tónica d' um serão entre a poltrona de baloiço e idas à cozinha a vigiar uma sopa de feijão, desejos de uma doente ( não grávida ) a quem amo com o meu coração de amar tudo. 
Uma sala acolhendo-me, o afago da música da terra longe, conversas sérias - sem gargalhadas mas com alguns sorrisos - conclusões lógicas, tolerância mil, olhares benevolentes sobre o mundo. Questionando, descartando raivas, ódios, vinganças. Dando mãos à palmatória. Conversas da infância; de gente pequena crescendo, num tempo que passou mas marcou, de gente grande retrospectivando. Conversas sobre os afectos, a longevidade. O reconhecimento. A vida e os seus filtros. A liberdade. A sua beleza.
Depois, já só, chegada a casa, a gratidão a impedir que esqueça quão preciosa é a vida. É tarde no relógio. Cedo para apagar este bem-estar de saber-me capaz de sentir. De sorrir e amar em troca de nada. Sem cobrar nada. E prosseguir.
Olho-me ao espelho e este devolve-me a cor e o tamanho da paz.
Talvez tenha chegado a hora de dormir.

m.c.s.

não sei ficar passiva

Nas pequenas, insignificantes causas habituei-me ( de menina até hoje) a ouvir a censura, desprovida de inteligência e bom-senso, caridade e razão.
- Não te diz respeito. 
Isso é lá com eles. 
Mete-te na tua vida. 
São crescidos que se entendam.
Não consegues mudar nada. 
Quem julgas que és?
Lá estás tu! Não mudas uma vírgula porque não és ninguém...
Mudei-me. Cresci. Olhei ao redor. Fui parar ao Tribunal. E isso muda tudo. Nas pessoas como eu. Que não cruzam os braços às injustiças. Não tapam a boca com adesivos. 
Não vendam os olhos fingindo-se de cegos. Não são passivas. E apontam o dedo aos mal intencionados. Calculistas e prepotentes. 
Nunca desisti. Das pequenas causas, às causas maiores vai um passo de formiga. Carreiro formado e organizado, destemido se forem muitas. Objectivo alcançado.
Vai um passo de gigante na mente dos cobardes, dos passivos, dos medrosos, dos egoístas e indiferentes. Daqueles que censuram os que alguma coisa fazem pela mudança, 
pela reposição da verdade e da justiça. Pela igualdade de direitos. Nem que seja numa fila do autocarro, dos correios ou do cinema. Pelo respeito que o outro nos merece. 
Pelo respeito que me mereço enquanto racional.
Nas causas insignificantes " desgastei-me ". Catalogaram-me. Agrediram-me e chamaram-me agressora. 
Não desisti. Não recuei. Não recuo nem desisto.
Que importa se me tratam por arrogante, atrevida, mal disposta, acutilante, cáustica, confusionista? 
Algo muda com atitude. Sem ela não sabemos quem morde quem. Se o cão que mordeu o homem ou o homem que mordeu o cão. Se é preciso morder alguém. 
À laia de brincadeira, aviso, ou muito a sério, eu direi que não desisto e se for preciso mordo também. 
O mundo será uma merda global se em cada local não se limparem e desinfectarem os sanitários.

m.c.s.

que falta de compaixão é esta?

 A fotografia de Aylan Kurdi tem corrido mundo. As estações televisivas, os jornais, as redes sociais divulgam-na. 
Eu não a divulguei. Não sou capaz. Por ele, o menino que com a sua família, fugia do pesadelo em que as suas vidas se transformara. Por mim. Que me confesso fraca. 
Incapaz de o fazer. 
Também porque pari dois bebés. Tive-os à vez no meu ventre ao longo de nove meses. Dei-lhes a luz dos dias e da vida e assumi tudo fazer por eles. Morrer ou matar inclusive. Se outra alternativa não houvesse. 
Senti-me impotente, revoltada, triste com a minha espécie. Pouco importa o que sinto, eu sei. Importa o que se faz às vidas que merecem viver como eu e fogem do espectro da morte, ameaçadas que são as suas, por outras vidas.
Aylan Kurdi foi, assim que bati com os olhos na sua morte tão indigna, o " meu " menino. E cresceu-me a indignação no rosto, na mente, na razão e no ventre. Na alma. 
Que tempos tão ruins, que mundo tão desigual, injusto e perverso, insisto, caindo no lugar comum. Afinal o lugar comum hoje é a fuga de homens. A quem já rotularam, estigmatizaram, de refugiados. Que não o querem ser. Que não querem a Europa. Que não querem perder a raiz. 
Daqui deste lado surgem ajudas. E críticas às ajudas. Detendo-se no poucochinho que cada um tem dentro de si. Fazem-se comparações. Chamam à fala e à insensibilidade os sem-abrigo. As famílias vivendo miseravelmente. O desemprego. O rendimento mínimo. A miséria deste país. Indigna. Encoberta. Desprezada. 
Daqui deste lado chama-se a política. O aproveitamento. Acusam-se atitudes do passado. Para com os filhos do país.
Esquecem ou lembram que há quarenta anos foram também refugiados. 
E do que aconteceu à época. 
Daqui deste lado querem discussão. Semeiam discórdia. Lançam dúvidas, doses dissimuladas de veneno. E com o peito cheio de ar não tratam o assunto pelo nome. Chamam os seus refugiados. Porque lhes dá jeito 40 anos depois. E tal como nesse tempo repudiam a entrada de refugiados que tal como os outros fogem à morte. 
Eu e a minha família fugimos à morte. Fomos refugiados. Os meus pais foram retornados. Embora não esqueça essa condição o meu olhar foi de perdão. A vida não correu sempre mal. Não sou menos dona desta terra que os outros que cá nasceram e já cá estavam. Que nunca saíram dela. 
A Aylan Kurdi acolhi-o como " meu " menino. No meu coração. E choro-lhe a vida interrompida. Mas não quero chorar mais. Por outros. E sinto-me uma fera à ideia de braços cruzados para outros Aylan Kurdi à porta das fronteiras da europa. 
Que importa se não nos são próximos, portugueses, europeus?
Que filha da putice é esta de gente comodamente instalada no sofá com um portátil nas mãos, navegando pelo facebook, que por um lado exibe a fotografia do menino e por 
outro não quer no seu país refugiados não europeus e não qualificados?
Que medo é este Deus meu, que já vi e o reconheço, quatro décadas depois? Que falta de compaixão é esta?
Acordem, cresçam, façam-se Gente. E mereçam-se.
Eu estou a tentar...

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Don McLean - Vincent ( Starry, Starry Night) With Lyrics

saudade

... e são as noites; as estrelas; 
e é o verão, o mar; e a madrugada;
o amor, a escorrer-me da pele, das mãos e da alma desencantada.
...e parece foi ontem, foi anteontem; parece foi há uma eternidade; 
o sol raiava, a estação mudava, a onda se espraiava.
E a lua, a terra iluminava.
...e eu...eu a amar a vida de novo com a alegria da criança. 
Na magia, no feitiço de (ir)real momento.
No voo da ave livre.
E com a força da natureza e da raiz que me prende ao chão e aos elementos. 
Amanhã, sim, amanhã, invento mil olhares para recriar o futuro.
Mas hoje, só hoje, não mais que hoje, deixo a saudade inundar-me o corpo, a sombra e a memória. 
Olho para trás. Chamo a poesia e o meu sentir. O arrepio.
Acolho a paixão. 
E cresce-me a vontade permitida de despertar de novo o coração. 
Para me ( re)viver ( outra vez ), na criança que o desencanto matou.

m.c.s.

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

no Tejo


esperando o metro


e viva a alegria

Eu e o Miguel, à frente do Gil. Expo. 

veraneando

No teleférico da Expo, este verão. Eu e a tia Manuela.

descanso entre caminhadas


no esquecimento

Não morres apenas quando te perdes das memórias.
Mas se outros perdem a memória de ti.
Digo eu, que morro de medo de morar no esquecimento das memórias.
De viver morrendo de esquecimento.

m.c.s.

a liberdade de ser

Amar um fantasma é fingir-se Livre.

m.c.s.

des (inspiração )

Seca
gasta
pouca
esta fonte onde bebi 
amor que tanto dei
e sofri
e em lágrimas me banhei
derramei...

Hoje
quando o dia amanhece negro
chamo o arco íris que a memória desenhou
E pinto
e canto
e minto
no quadro-mundo
desta falsa ilusão
pobre coração
de sentir tão profundo
desmaiado
e derrotado
nos cinzentos avivados em mim

Seca 
gasta
pouca
esta fonte no seu fim...

m.c.s.

a liberdade de ...

Os fantasmas não se amam.
Libertam-se...

m.c.s.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

ainda eu

Ainda brilho nas estrelas mortas 
Na memória do firmamento
Ainda respiro, 
Cinza e fumo, poeira
Partículas à deriva
Na arte que me ensinou, o pensamento
E viro páginas em branco, vazias
E escrevo a ouro e prata 
E todos os metais do mundo
Diário do meu lamento
Marca, tatuagem, futuros
Na sombra, paredes, muros 
Gritos, do meu eu mais profundo...

Ainda brilho nas estrelas mortas
Na explosão dos meus festins
Ainda ardo no fogo das horas
Ainda sonhos de carmim
E beijos, suspiros, 
Salvas, foguetes
Clarões de luz, 
Constelações
Mitologia, lira, canções...

Ainda a poesia
Ainda a fantasia
Entre um tempo morto e outro que nasceu

Ainda eu...

m.c.s.

pedido

Não me peças os teus vazios.
Erros e mentiras.
Minhas entranhas.
Auroras inventadas.
Sonâmbulas.
Ideias esventradas 
Vidas estranhas...
Não me peças pesadelos. Convertidos.
Pântanos transformados em rios.
Demónios, fantasmas e sentires
falsamente exorcizados...
Não me peças massagens, abraços e beijos no ego
nem silêncios e cumplicidades. Sorrisos cobardes.
Não me peças clichés. Vulgaridades...
Não me peças milagres.
O meu lugar (in)comum é o amor. 
Onde sonho o mar e expulso a dor.
Onde me sento a amar
o que foste e hás-de ser em poemas de te dar.
Não me peças nada se não me vês. 
Se não o sentes. Nem o és.
Não me peças gestos, palavras e castrações.
Não me peças silêncios às emoções. 
O meu lugar (in)comum se chama alma. 
Leve, 
pura, 
calma.
Não me peças ( mais ) nadas...

m.c.s.


ontem

Ela, a madrinha, chamou-me Clarita. Num carinho que sempre me enterneceu. A sua mais velha, Clarinha e as pombas, a do meio Clarance, como sempre me haviam tratado, num misto de ternura e troça; e a mais nova, a minha companheira de tantas brincadeiras, tantas confidências, tantas vidas vividas numa só, olhou-me doridamente e abraçou-me. Abraçámo-nos...
Os amigos, pessoas que se amam há uma vida inteira, que partilharam tanto bem querer não deviam encontrar-se para despedidas para sempre. Partidas eternas...
Mulheres da minha vida, elas são responsáveis por parte daquilo que sou. Aprendi e ganhei mundo com todas. Vivi-lhes dias lindos e longos. Noites estreladas. Regras. 
Limites. Beleza. Descobertas. Sabedoria. Magia. Futuros. 
E fui uma criança feliz junto delas. E uma adolescente abençoada. E tinha vinte anos quando me despedi entre lágrimas e acenos. Esperanças de voltar.
Passaram quarenta anos e nunca mais tínhamos conseguido estar as cinco juntas ao mesmo tempo. A espaços a mais velha, a mais nova e a madrinha. Também a do meio e a mais velha juntas. A mais nova sozinha. Foi preciso a morte tocar esta família para nos reunirmos.
Ontem, não fora ser tão dolorosa e cruel a partida de alguém e teria sido um dia muito feliz para mim. Acredito que para elas também.
Por umas horas voltei a casa. Às minhas pessoas. Ao lugar do amor que nunca morre. Ao lugar do afecto, do respeito e da verdade. Àquele lugar eterno tão precioso. O da 
Amizade. Em dose quádrupla. E ouvi chamarem-me Clarita, Clarance, Clarinha e as Pombas e demos um abraço sofrido e maior do que o Mundo. Para lá de cinco céus.
Há uma ternura profunda quando se ouve - é a minha afilhada.
É a minha amiga de infância. 
Há um carinho desmedido quando sabemos ser a afilhada, a amiga de infância. 
Mas foi preciso a morte passar perto para celebrarmos a vida que já vivemos juntas e a riqueza que isso é. 
A maldita roubou-nos a cena. Mas não nos roubou o amor que sentimos. Nem os laços que criàmos. 
Não fora ela e ontem teria sido um dia de reencontros tão feliz...

m.c.s.

seres presentes

Há seres quase velhos, de tão sábios e anos acumulados. Que são meninos.
Têm uma varinha de condão e tocam almas. E fazem dos momentos tempos eternos.
E pincelam-te sorrisos no rosto. E ternura no olhar. 
E beliscam-te os sentimentos. 
E sem qualquer razão que não a de serem meninos, conquistam-te o coração. 
Para afagos na alma. Na emoção.
Breves presentes. 
Há seres quase quase, mas nunca amanhã...
Tal como os meninos, têm muito para dar. 
E acreditam em bicos de pés, cordas, escadas, pontes e asas, para lá chegar. Mas não para envelhecer e parar.
Há seres que são meninos. Eternos. E levam-te à magia desse mundo de brincar. De sonhar...
Há seres que transportam o menino e moram na minha nobre verdade. 
Na minha doce e triste saudade. Numa curva da memória. 
No malmequer que desfolhei... 
Na minha mais breve e louca história. 
Mulher/ menina que também me sei. A escassos tempos. 
Surreais momentos. De encantamento...

m.c.s.

forma de dizer

Não sou poliglota
Nem dona de mil linguajares
Não sou artista, professora
Nem contorcionista
Ou doutora
Na arte de bem falar 
Não me importo com o sotaque
Nem forma gramatical 
Não me importo com a voz
Palavras de ocasião
Não me importo com os erros
Pago-os se os tiver que dar... 
Não tenho língua materna 
Nem outra de precisão
Minha língua é afiada
Pronta e bifurcada
Recorrente e sempre " à mão "
Minha língua é dialecto
Com que falo, coração..

m.c.s.