segunda-feira, 30 de agosto de 2010

as férias dos outros

Estou com um torcicolo arranjado não durante a noite, mas logo pela manhã.
Isto hoje correu mal. A D. Pitanga achou por bem desaparecer-me com o relógio ( novo ) e com o telemóvel. Só não desaparece com os óculos porque os fecho a 7 chaves, quer dizer, na gaveta da mesinha de cabeceira, porque aprendi e a duras penas que não pode fazer companhia às outras peças que me são essenciais. Já não tenho pachorra nem ânimo para começar a semana espreitando para baixo da cama.
Coisa deprimente, ajoelhar-me perante a semana, curvada e fatalistamente conformada. Eu bem tento, mas não tenho essa natureza e o mau feitio vem ao de cimo. Prometo-lhe tareia, ameaço e ela olha-me naquele olhar azul mar e céu. E eu vou fazer o quê? Não é gente. E gente já me escondeu não relógios nem telemóveis, mas pensando bem, também, e eu tive que me aguentar à bronca.
Mas 2ª feira nem o é, se não correr mal, para justificar a tradição e a minha má vontade.
Entrei no bendito do autocarro e avistei ao fundo um companheiro de viagem antigo, que conheço de outras paragens. Perguntei-lhe pelas férias. Foi o que quis ouvir. Eu não tenho emenda. Sempre a pôr-me a jeito. Mas porque é que não fingi que o tinha visto no dia anterior e já sabia assim que tivera umas férias maravilhosas?!
1º, porque não sou fingida e depois por 2 razões. Férias só são fantásticas se terminarem na partilha. O ego está insuflado e quando alguém, ( depende do alguém ) nos pergunta - atão?Isso é que foram férias, ahn??? isto é o mote para que a gente volte a viver tudo de novo com um prazer especial. E na nossa cabeça faz-se assim como que uma confirmação - Estava a ver que nunca mais perguntavas -
A 2ª razão é que nós, dependendo do destino de férias, temos curiosidade, não mórbida, porque achamos sempre que nós aproveitariamos muito mais e melhor, mas há uma cusquice pequena, mas cusquice para sabermos o que viram, o que comeram, o que se divertiram, como foi que...em suma quem faz férias em Nova Iorque e um cruzeiro a partir dali e visita Miami, é concerteza alguém com outros horizontes e a gente quer perceber como é que se move no mundo, a pessoa que temos ao nosso lado e que nos provoca o torcicolo, porque são 20 minutos sem pestanejar, a olhar para o lado, nos olhos de alguém ainda babando deslumbrado pelo que deixou para trás.
A olhar para o lado e num enjôo dos diabos, não do discurso fantástico, mas das curvas do autocarro.
Mas quem me mandou a mim fazer perguntas ansiosas por respostas longas e pormenorizadas?
Bem, mas pronto, o ego do meu conhecido de longa data está bem e recomenda-se. E à 2ª feira é um milagre.
Fiz-lhe a última pergunta, das muitas que pude e quis fazer, na curiosidade óbvia de saber como vai o mundo do outro lado.
- E agora, a caminho de Vila Moreira, como é que é possível trabalhar sem fazer asneiras com os dedos e mandar assim para o ar uma asneira cabeluda do tipo - F......, ( isto não disse que sou uma senhora, troquei por um Bolas! ) já estou de novo nesta parvalheira!
É que por muito menos, por um fim de semana no Olival Basto, eu não digo uma, mas todas as que conheço e mais algumas que invento e estico os lábios que já não são finos, num " beiço " desgraçado para que não haja dúvidas que tudo, é melhor que o tarrafal, fará este pobre de Cristo que viveu 15 dias noutra dimensão...
Ele riu-se amareladamente, e com um olhar baço disse-me: Hoje é difícil mas ainda falo nisso, amanhã é pior porque já ninguém me pergunta pelas férias e até me convenço que foi um sonho.
Cá para mim, só sei que estou com um torcicolo à conta das férias desta criatura e não cheguei nem perto de um avião, ou do comandante dizendo- Senhores passageiros fala-vos o comandante...
Eu nunca mais aprendo. Quem me mandou a mim querer ver a extensão do ego deste companheiro de viagem que ao longo do ano viaja discretamente ao meu lado num reles autocarro da Rodoviária, e depois em 15 dias vive em explosões de encantamento como nos contos de fadas, entre aviões de longa carreira, cidades maravilhosas e apelativas, barcos fantásticos e luxuosos e locais onde alguns só nos filmes têm oportunidade de conhecer ...
Olha eu! E agora quem me faz uma massagem? Ninguém. E como não tenho voltaren ou reumon lá tenho eu que ir à farmácia e à conta das férias alheias vou entrar em despesas.
Acho que amanhã apresento-lhe a conta da farmácia. Ou não? Não.
Penso que me vou sentar do lado contrário e pergunto-lhe onde passará as férias do ano que vem. Há-de dar história para os 20 minutos de viagem e assim como assim fico com o pescoço compensado. Nos dias seguintes farei a viagem mais do que calada, muda, olhando para a frente...e depois, serei eu que direi, xau, xau que vou de férias. Mas mesmo assim a pôr o 2º pé no chão para que não haja perguntas nem respostas.

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