domingo, 16 de janeiro de 2011

fixação


Gosto do domingo de manhã. Só até à hora do almoço. Se estiver cá. Quer dizer, estou sempre cá.
Não gosto da tarde de domingo se tenho de voltar para o tarrafal.
Recapitulando, habitualmente o domingo é bom até ao almoço. Mas curto bués tardes de domingo em que não faço nada e fico no sofá a preguiçar. Como se o mundo parasse e eu contribuísse para tamanha pasmaceira.
Se não houver sol. E fizer frio. Olhando labaredas duma lareira que não tenho, alimentando-me de domingos tão bonitos e sem hora marcada para regressar que já vivi e sonhando realidades que ficaram para trás, bebendo chás de aromas, sabores exóticos que já provei, tendo sensações de prazer e paz que as tardes de domingo nos dão.
Mas há pesadelos que não nos abandonam assim às primeiras. Nem segundas, nem terceiras. Do tipo, peçonha, que moem e remoem, porém um dia acabam num basta com os dois punhos fechados em cima da mesa, de preferência de pedra, para não quebrar.
Nas manhãs de domingo tenho um ritual que muito me fortalece e alivia. Como que um exorcismo. Lançar dardos num tiro ao alvo que imagino até à exaustão, do esforço que faço para acertar em cheio no dito saco de pancada.
Acontece quando volto das compras e passo a ponte a pé, puxando o carrinho de rodas, vermelho, cheio de peso. Assim que saio do super mercado e enfrento a estrada e o movimento na rua, surge como que uma vontade enlouquecida de dizer asneiras dirigidas como tiros de dardos directos ao alvo. Eu não sou louca mas também não sou santa e um palavrão assim muito à moda do norte, não recuso.
Cheira-me a domingo. E é até pecado esta prática tão pouco cristã. Pareço os putos da escola no autocarro, dizendo cada palavrão maior que outro. Para dentro, claro, que ninguém me ouve uma vogal sequer que denuncie tão escabroso vocabulário. Não tujo nem mujo, porém alivio os ombros e a coluna, do peso da condição em que me coloquei. E o coração faz as pazes com o meu cérebro que não deseja mal a ninguém, nem mesmo a quem me fez mal.
É o momento de despejar o que não presta e entregar ao Universo, porque não me serve nem para reciclar.
Não sei se já perceberam mas é uma coisa assim como que expulsar demónios e matá-los. Não sou doida, nem me passo. Às vezes até rio deste vício em forma de arremeço. Isto acontece porque me vejo a caminho de casa puxando um carrinho de compras. Aos domingos. A pé. Depois de o ter feito mais de mil e uma vezes noutra condição.
É só uma ponte e uns metros de rua. É só uma escolha que faço. É só uma forma de viver que não tem volta atrás. É só conversa minha, ritual ou vício de dizer asneiras ainda que para dentro ecoando só na minha mente e com endereço.
É só um pouco de pena de mim, quer dizer, da minha coluna.
É só para depois, chegar aqui e debitar um texto que pareça bem verdadeiro a provar que tenho domingos de manhã bem animados.
É só...mas também...

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