Acordo na manhã iluminada pelo sol que se empoleira na minha janela.
Temo pela hora. Puxo o relógio, coloco os óculos e vejo a custo. Sete horas. Não tarda vai tocar o despertador do telemóvel. Quando passei a viver sozinha, um dos meus pânicos, era achar que me atrasaria sempre porque não teria quem me acordasse, quando, afinal, era eu quem acordava primeiro.
Deixo-me ficar uns minutos mais. Tenho a ilusão de ser feriado. Estou adiantada. Amanhã é que será. Quinta-feira da ascensão. O dia de apanhar papoilas, malmequeres selvagens, espigas de trigo, ramo de oliveira, fazer um raminho e guardar na cozinha, despensa, ou onde nos apetecer para que tenhamos fartura (?) o ano inteiro, diz que também, o resto. Havia um simbolismo que se foi perdendo quando se substituiu a ida ao campo merendar, bolas, como é que me saiu esta palavra se eu nem gosto dela? deve ser por estar já envolvida no espírito campestre, bem, mas na verdade é que de ramos de espiga passou-se a roupa na zara, hamburger no MC ou um filme numa das salas de cinema num qualquer centro comercial, de preferência na capital, em Leiria, Coimbra ou para sul..
Bom, tenho de adiar o gozo da cama para amanhã., uma vez que poderei ficar até me apetecer. Sei que é o costume, posso, não quero, não posso, desejo ardentemente. Aqui está o pensamento feliz para quem o escreveu: O fruto proibido é o mais apetecido.
Escolho a roupa. Uma túnica acabada de comprar, salmão. Da moda. Se fosse verde da moda, não era a mesma coisa e certamente não a compraria, porque não gosto de roupa verde. Tenho saco, relógio, colar e até pulseira salmão mas longe de mim enfarpelar-me desse jeito de fazer pendant. Os kanucos dizem que já não se usa. E eu também acho que é um pouco demais tudo a condizer. Nunca percebi essa lógica. Nunca percebi essa limitação de misturar cores. Escolhi então a túnica, calças de ganga, sandálias e carteira castanhas. O colar a fazer pendant com a túnica, presente do F. num aniversário há três anos. O F, tem bom gosto. O ano passado recebi o relógio...salmão. O F. já está nas nossas vidas há muito tempo. Nem dou por isso mas se me ponho a pensar, percebo que já recebemos e demos muitos presentes.
As sandálias têm o salto alto. Gosto do andar que sou obrigada a fazer quando estou em cima de umas andas. É mais cauteloso e elegante. Sinto-me uma senhora.
Descubro uns rolos de esponja num necessaire que usava nas viagens por uns dias, quando me deslocava de automóvel. Ponho-os no cabelo para provocar ondulação nas pontas. Fica giro. Parece que visitei a cabeleireira. Para quê tudo isto? Parece que estou a abonecar-me com o propósito de agradar a alguém e não. Coisa do ego, auto estima, sei lá. Leio essas coisas e aplico também em mim. Deve ser assim. Também dizem que as mulheres se vestem para as outras mulheres e não para os homens. Percebo isso. Eles despem-nas quando elas estão demasiado bonitas, também dizem. Nem acredito que estou com este discurso preconceituoso. Despem-nas? Mas a mulher precisa lá de fazer o jogo da matadora que vai ser conquistada pelo macho? Despem-nas! Ora essa! Mas as mulheres estão entrevadinhas ou quê? ...
Bem, mas porque há mulheres que se vestem para que as amigas as invejem, outras para que os homens as dispam com os olhos e fiquem a fazer contas de dividir, outras porque são vaidosas, outras ainda porque gostam mesmo delas e gostam de se sentir amadas, admiradas, bonitas, não me perco muito a pensar nos quês e porquês.
O verão está aí já já, as cores da estação dão vida e beleza a qualquer um, senão, vejamos, quando um homem, alto, pele morena, olhos escuros, sorriso enigmático, sim, esse sorriso que muitas vezes é de gente burra mas que a mulher confunde com mistério, veste um polo vermelho, rosa velho, branco ou azul bebé qual é a mulher que não olha duas vezes? Eu olho. Sobretudo se tiver voz bonita, mãos bonitas e estiver bem calçado. Pode até não ter cabelo, ter rugas, óculos, pode até ser cambaio, muito magro ou ter uma barriguita, eu olho. Olho se oiço a voz e me cala cá dentro. Olho se dá balanço no pé e o sapato é de bom gosto, não precisa ser de marca cara, precisa só de fazer pé bonito e elegante apesar do 43 ou 44. Olho se tem mãos bonitas. Tenho fetiche por mãos e voz. Olho se tem tudo isso, porque mais que homem, parece um verdadeiro príncipe e eu sempre gostei de estórias de reis e rainhas e príncipes e princesas, palácios e castelos.
Enfim, para quem se está a vestir para ir trabalhar estou a elaborar tudo como se fosse para um acto mais interessante e ou importante. Por falar em actos, ainda ontem fiquei chocada quando dei de caras com uma ata a que faltava o cê. Porque raio estes facilitismos da língua portuguesa que para burro velho que não toma ensino, é tão perturbador?
Saio de casa às 8 e 10, empoleirada nos meus saltos altos. Foram bem caros. Comprei-os na Nazaré numa sapataria perto do Picadeiro. Acho que não vou à Nazaré desde esse dia. Sabe-se lá porquê.
Dou um olhar no espelho. Sorrio-lhe. Quê que se passa comigo hoje? Se continuo assim vão dizer que vi passarinho novo. Irrita-me que me queiram espiar a expressão. Que façam leituras volúveis.
Não levanto o dedo polegar da mão esquerda num, fixe, estás bué...porque eu maria clara das dores já não falo com espelhos. Mas volto a pensar: estou a fazer festas ao ego p'ra quê? No fundo no fundo até desconfio mas não conto.
E sim, ninguém me gaba nunca. Apenas a minha cria caçula que depois de estar mês e meio sem me pôr a vista em cima senão no skype, me olha e diz - estás mais magra, não estás? Abençoados batidos e saladas das últimas duas semanas. Abençoado calor e abençoadas caminhadas. É verdade. Porque quando ele diz eu acredito. Também me faz dar meia volta, olha-me de alto a baixo e diz ainda: pareces mais nova. Estás mais nova. Abençoado filho. A única criatura que me olha e diz o que vê e toca o meu coração porque a gente precisa de vez em quando dum abanão. Que diabo, não estou morta e à minha volta todos sabem disso, mas fecham-se em copas. Mesmo quando visto uma túnica salmão, novinha em folha, enrolo as pontas do cabelo, pinto as unhas, calço saltos e sorrio. Porque será? Acho que sei, mas deixo para lá.
Sinto os sorrisos dançarem na minha expressão. A gargalhadas a tomarem assento nos meus lábios. A boa disposição aparecer e me dar a mão. Estou na rua, a caminho do dia de trabalho. Mais um a somar àqueles que vão fazer a diferença na minha reforma. Amanhã é feriado municipal. Tenho planos. Que a serem concretizados serão fixes. A temperatura sobe nos termómetros. Vai chegar aos 36 graus.
Nasci nos trópicos, como dizem aqui. Estou habituada ao calor. E gosto. Que é diferente de estar como peixinho dentro d'água. É mais, como é bom estar com os pés na água, olhando o mar. A ver vamos...
Bom, tenho de adiar o gozo da cama para amanhã., uma vez que poderei ficar até me apetecer. Sei que é o costume, posso, não quero, não posso, desejo ardentemente. Aqui está o pensamento feliz para quem o escreveu: O fruto proibido é o mais apetecido.
Escolho a roupa. Uma túnica acabada de comprar, salmão. Da moda. Se fosse verde da moda, não era a mesma coisa e certamente não a compraria, porque não gosto de roupa verde. Tenho saco, relógio, colar e até pulseira salmão mas longe de mim enfarpelar-me desse jeito de fazer pendant. Os kanucos dizem que já não se usa. E eu também acho que é um pouco demais tudo a condizer. Nunca percebi essa lógica. Nunca percebi essa limitação de misturar cores. Escolhi então a túnica, calças de ganga, sandálias e carteira castanhas. O colar a fazer pendant com a túnica, presente do F. num aniversário há três anos. O F, tem bom gosto. O ano passado recebi o relógio...salmão. O F. já está nas nossas vidas há muito tempo. Nem dou por isso mas se me ponho a pensar, percebo que já recebemos e demos muitos presentes.
As sandálias têm o salto alto. Gosto do andar que sou obrigada a fazer quando estou em cima de umas andas. É mais cauteloso e elegante. Sinto-me uma senhora.
Descubro uns rolos de esponja num necessaire que usava nas viagens por uns dias, quando me deslocava de automóvel. Ponho-os no cabelo para provocar ondulação nas pontas. Fica giro. Parece que visitei a cabeleireira. Para quê tudo isto? Parece que estou a abonecar-me com o propósito de agradar a alguém e não. Coisa do ego, auto estima, sei lá. Leio essas coisas e aplico também em mim. Deve ser assim. Também dizem que as mulheres se vestem para as outras mulheres e não para os homens. Percebo isso. Eles despem-nas quando elas estão demasiado bonitas, também dizem. Nem acredito que estou com este discurso preconceituoso. Despem-nas? Mas a mulher precisa lá de fazer o jogo da matadora que vai ser conquistada pelo macho? Despem-nas! Ora essa! Mas as mulheres estão entrevadinhas ou quê? ...
Bem, mas porque há mulheres que se vestem para que as amigas as invejem, outras para que os homens as dispam com os olhos e fiquem a fazer contas de dividir, outras porque são vaidosas, outras ainda porque gostam mesmo delas e gostam de se sentir amadas, admiradas, bonitas, não me perco muito a pensar nos quês e porquês.
O verão está aí já já, as cores da estação dão vida e beleza a qualquer um, senão, vejamos, quando um homem, alto, pele morena, olhos escuros, sorriso enigmático, sim, esse sorriso que muitas vezes é de gente burra mas que a mulher confunde com mistério, veste um polo vermelho, rosa velho, branco ou azul bebé qual é a mulher que não olha duas vezes? Eu olho. Sobretudo se tiver voz bonita, mãos bonitas e estiver bem calçado. Pode até não ter cabelo, ter rugas, óculos, pode até ser cambaio, muito magro ou ter uma barriguita, eu olho. Olho se oiço a voz e me cala cá dentro. Olho se dá balanço no pé e o sapato é de bom gosto, não precisa ser de marca cara, precisa só de fazer pé bonito e elegante apesar do 43 ou 44. Olho se tem mãos bonitas. Tenho fetiche por mãos e voz. Olho se tem tudo isso, porque mais que homem, parece um verdadeiro príncipe e eu sempre gostei de estórias de reis e rainhas e príncipes e princesas, palácios e castelos.
Enfim, para quem se está a vestir para ir trabalhar estou a elaborar tudo como se fosse para um acto mais interessante e ou importante. Por falar em actos, ainda ontem fiquei chocada quando dei de caras com uma ata a que faltava o cê. Porque raio estes facilitismos da língua portuguesa que para burro velho que não toma ensino, é tão perturbador?
Saio de casa às 8 e 10, empoleirada nos meus saltos altos. Foram bem caros. Comprei-os na Nazaré numa sapataria perto do Picadeiro. Acho que não vou à Nazaré desde esse dia. Sabe-se lá porquê.
Dou um olhar no espelho. Sorrio-lhe. Quê que se passa comigo hoje? Se continuo assim vão dizer que vi passarinho novo. Irrita-me que me queiram espiar a expressão. Que façam leituras volúveis.
Não levanto o dedo polegar da mão esquerda num, fixe, estás bué...porque eu maria clara das dores já não falo com espelhos. Mas volto a pensar: estou a fazer festas ao ego p'ra quê? No fundo no fundo até desconfio mas não conto.
E sim, ninguém me gaba nunca. Apenas a minha cria caçula que depois de estar mês e meio sem me pôr a vista em cima senão no skype, me olha e diz - estás mais magra, não estás? Abençoados batidos e saladas das últimas duas semanas. Abençoado calor e abençoadas caminhadas. É verdade. Porque quando ele diz eu acredito. Também me faz dar meia volta, olha-me de alto a baixo e diz ainda: pareces mais nova. Estás mais nova. Abençoado filho. A única criatura que me olha e diz o que vê e toca o meu coração porque a gente precisa de vez em quando dum abanão. Que diabo, não estou morta e à minha volta todos sabem disso, mas fecham-se em copas. Mesmo quando visto uma túnica salmão, novinha em folha, enrolo as pontas do cabelo, pinto as unhas, calço saltos e sorrio. Porque será? Acho que sei, mas deixo para lá.
Sinto os sorrisos dançarem na minha expressão. A gargalhadas a tomarem assento nos meus lábios. A boa disposição aparecer e me dar a mão. Estou na rua, a caminho do dia de trabalho. Mais um a somar àqueles que vão fazer a diferença na minha reforma. Amanhã é feriado municipal. Tenho planos. Que a serem concretizados serão fixes. A temperatura sobe nos termómetros. Vai chegar aos 36 graus.
Nasci nos trópicos, como dizem aqui. Estou habituada ao calor. E gosto. Que é diferente de estar como peixinho dentro d'água. É mais, como é bom estar com os pés na água, olhando o mar. A ver vamos...
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