quarta-feira, 16 de maio de 2012

no fim da tarde...

foto tukayana.blogspot
Saio de casa apressada. Estou habituada a andar parece que vou a fugir à polícia ou de ladrões, para o caso tanto faz. Marquei, oito horas. Passam uns minutos bons. Apesar de não parecer, stresso com a ideia de que ficam à minha espera. Dar desculpas p'ra quê? Invento, invento e acabo por sair ali mesmo résvés.
Passo junto ao ginásio da Lena C. . Sempre a malharem nas máquinas. No meu tempo a sala das máquinas não era aquela. Suei muito ali. E depois muito banho turco. Com mais duas. Não gostava disso. Gente que mal conhecia, a suar comigo no mesmo cubículo. Conversas de xaxa. Sorrisos de circunstância.
Em frente ao ginásio um carro parado e a Drª S., uma ilustre advogada que por vezes se cruza comigo na casa da justiça, sorri. 
- Olá doutora.Tá boa?
- Boa tarde dona Clara. Por aqui?
- Vou andar. 
- Mas a senhora já anda tanto! Vejo-a todos os dias de manhã a subir...
- O viaduto. Completei.
Tenho o péssimo defeito, sei que deve ser mau para quem está do outro lado, mas repito, tenho o defeito de completar as frases a quem comigo fala. Se gaguejam então falta-me a paciência e mesmo que não seja a palavra que o outro quer dizer, levo-o a dizer a minha palavra. Já me tenho perguntado se é só falta de paciência se é porque quando sou eu a falar, me faltam as palavras certas, nesta dificuldade oral de expressão que sei que tenho, apesar de me dizerem sempre: Ah mas não, não noto nada, e tal e coiso...deve ser a timidez que sempre tive para o discurso, o ouvir-me, o julgar-me, enfim, paranóias.
Sigo sorrindo. A doutora vai tantas vezes ao balcão e nunca me dissera que me via diariamente nesse sacrifício sofrido de subir o viaduto. Já o Luís M., logo pela manhã, parou a sua viatura antes do viaduto  para mais uma boleia até ao colégio Santa Maria, da congregação de são josé de cluny, porque é generoso e deve ter pena de mim, sempre são 600 metros de esforço para o pobre coração que tem dias parece que vai saltar-me pela boca e estatelar-se lá em baixo, na quinta.
Avisto a minha companheira de marcha ao fundo da rua. Cansou-se de esperar e veio ao meu encontro. 
Está calor na cidade. O esforço é maior. Ainda é dia. E há movimento. Gente que passa de carro, gente que passa a pé, de bicicleta e de mota. Há vida na cidade. Decidimos passar em frente à E.P.P. e seguir como quem vai para o E.P.T.N. Por becos e vielas caminhamos no fim da tarde. Apenas uma atleta perfeitamente identificada corre à nossa frente. As luzes vão acendendo à nossa passagem.
Lembro o telefonema que recebi mesmo antes de sair de casa.
- Clarinha minha querida...estás bem? uma voz preocupada
- Estou, porquê? e logo me arrependi da dureza do tom. Não posso tratar mal quem me trata bem. Não posso sacudir pessoas que se dão ao trabalho de me telefonarem. De pensarem em mim. De se preocuparem comigo. Afinal, não é isto que toda a gente gosta? Sentir-se acarinhada?  Porque raio é que eu gostando disso também, falo com duas pedras na mão?   Gosto que me tratem com carinho e que me chamem querida. Nem sempre sou. Clarinha sou desde pequenina para muita gente e também gosto desse miminho. Sou uma mal agradecida é o que é.
- Porque ouvi a notícia da explosão aí na tua terra, disse com intenção de me picar.
- Minha terra, uma ova. Continuei. E pensaste que eu me explodi?
Risos do outro lado. - Não. Tu é que explodias com meia dúzia.
Fui obrigada a rir. 
O meu amigo para além de angolano com sotaque fortíssimo, tem piada, gosta de me telefonar e sei que se preocupa comigo. Afinal eu fizera o mesmo assim que soube da explosão no fogueteiro. Liguei ao mano Zé a saber onde estava. Não é a primeira vez que o tal  armazém faz explodir tudo à sua volta e o estrondo se ouve na cidade. E os bombeiros se fazem também ouvir e assustam quem mora perto.
A volta hoje custou mais. E o calor desajuda. Quando cheguei a casa já era noite. A minha parceira do lado trazia aquele aparelhómetro que diz tudo o que a gente precisa saber para se alegrar.  Então fiquei a saber que andei sete quilómetros mais sessenta e oito metros. Numa hora e tal. Nove de marcha apressada, o que significa que o resto foi a passear. Lembrei-me que apesar de não ver montras de facto a pedalada não foi a correcta para quem precisa de queimar calorias. Só que o coração beneficie com isso já não é mau.
Ao chegar a casa, a Xana, minha vizinha do lado, vem a correr do Café e bem humorada cumprimenta com um efusivo, olá vizinha. Fala para o 3º andar. Olho também p'ra cima para o Black, o gato preto que deve pensar que é trapezista pois que passa os dias de cá para lá no estendal da roupa protegido por uma estrutura metálica. 
- Black vai para dentro. O meu gato dorme ali, vizinha, diz-me ela. 
- E não cai? A minha Pitanga não seria capaz.
- Ele gosta de dormir ali. 
São três andares. Medonhos três andares. Dá-me um arrepio na espinha. Nem quero imaginar a Pitanguinha passeando-se pelo estendal da roupa. Como é que eu viveria sossegada imaginando a bichinha no trapézio, sem rede?
Há gente que vive com o coração tão descansado...
Entro em casa. Dona Pitanga rebola-se na tijoleira despudoradamente. Um dia destes mando a veterinária às urtigas e enfio-lhe a pílula goela abaixo. A pobre bichinha sofre que sofre nesse cio que ainda há poucas semanas acabou e já está de volta. E eu sofro a vê-la desse jeito pouco digno de ser e estar.
O dia está no fim. Mais um, cumprido. 



2 comentários:

Mariliza disse...

Ola, passei por aqui hoje para ler as novidades e me deparo com seu comentario sobre antecipar o final das frases....tambem tenho o mesmissimo problema, dizem que eh falta de educacao...entao tento ao maximo me patrulhar para nao fazer isso, mas normalmente as letras se juntam no meu pensamento e sem sentir, a frase ou palavra sai....coisa feia! Faz parte do tal sindroma do panico...tudo faz parte. Tenha uma boa quinta feira porque a quarta ja esta se acabando....Ate mais!

Maria Clara disse...

Muito obrigada Mariliza. Gosto que passes para leres as " novidades "
Beijos e uma boa quinta-feira também para ti.