sexta-feira, 6 de julho de 2012

sempre a desgastar-me




Sento-me no banco da paragem do TUT. Poiso os sacos. Podia ser chamada, a mulher dos sacos. Sempre com eles. Acho já não sei andar sem eles. Habituei-me a transportar uma carga pesada que muitas vezes não é senão um fardo que custa mas do qual não me desembaraço.
Tiro a embalagem das línguas de veado. Eu sei que são crocantes, mas não são línguas de gato. Não gosto de línguas de gato. Para além do resto, lembro-me da minha Pitanga, pobre Pitanguinha que está de novo naqueles dias difíceis e paga maria clara, paga e não bufes. Quem te mandou ter uma gata? Pois é. Bem que me avisaram, mas era ver para crer e eu não sendo teimosa, preciso de passar por elas para aprender com elas.
Abro a embalagem e tiro duas línguas de veado. Levo-as à boca. O banco da paragem de autocarro reconhece-me. Sim, porque eu sou a tal que vai ao Modelo, invariavelmente compra um frasco de sumo natural de cenoura e maçã, fresquíssimo, e vai bebê-lo para a paragem do autocarro. Aos poucos. Não tenho frescuras de senhora, que ah e porque tal e coiso, uma senhora não come na rua. Não, não come...
Uma senhora não pode é ter sede ou fome ou as duas. Nem pode ter impaciência enquanto espera e não pode fingir que não lhe agrada beber um sumo natural e comer umas línguas de veado que apesar de serem fresquíssimas e crocantes, deixam-se comer lindamente, ali mesmo na rua, sentada no banco. Adianto que...o hábito se tornou vício e acabo sempre a comer e a beber ali, como se dum banquete se tratasse. Já me habituei à espera e tenho andado à coca a ver se fixo este estranho horário para não ter de fazer sala com varanda virada para a rua, por onde passam cretinos, imbecis, indiferentes e até conhecidos e amigos, que olham, falam, sorriem e seguem. É que também não ando com a melhor das pachorras e o sol está quente e pronto, estou melhor em casa que num banco da paragem de autocarro.
Ando insuportável eu sei. Nem eu própria me aturo. As férias mesmo aí a fazerem-me caretas. Simpáticas. E eu ingrata nem retribuo. Os nervos em franja porque as tralhas são mais que muitas, a Pitanga que odeia a gateira, o computador que é pesado para transportar, as minhas dores que são umas cabras pegajosas feitas lapas, enfim, nem sei se são desculpas que arranjo para justificar esta angústia que se apoderou de mim nos últimos dias, se sou eu só a armar. Mas porquê? Para quê? Para quem? Para nada. Para ninguém. Eu sou mesmo sozinha. Conto apenas comigo, salvo raras excepções que têm nome e sabem bem quem são que se não me dessem uma mãozinha nem sei o que seria de mim, mas na verdade, tenho mesmo que me virar e não sei porquê que ando enervada por causa da minha deslocação, das férias e do que isso implica. Ou sei? Sei lá...
O TUT que venha que eu estou farta de pensamentos solitários, de perguntas e respostas, truques e apostas. Que quer ganhe quer perca, fico sempre a perder. Quem me manda apostar com a outra de mim? Sempre a desembolsar. Sempre a desgastar-me...

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