quarta-feira, 26 de setembro de 2012

por entre os pingos da chuva


Chove. Saio do carro.
Choveu toda a tarde e pela noite fora.
Como no inverno. Que se passa com o tempo?
O outono não pode chegar tão abruptamente. Causa danos nos corpos  doentes.
Nos espíritos inquietos. Nos solitários. Nos cansados. Nos desiludidos.
É triste e espalha tristeza. Desânimo. Lembra mais a pobreza e o desencanto.
Saio do carro. Atravesso a rua. Não abro o chapéu. Sou rápida e escapo por entre os pingos da chuva. Às vezes consigo essa artimanha. Hoje consegui. Num esforço sobre humano.
Às vezes é necessário. Não há outra saída. Ou é…ou é. E o que tem de ser, tem muita força, dizem.
Dou à chave. Oiço o motor do carro quando acendo a luz das escadas. Sorrio. Inunde-se de luz o meu espírito.
Quase tanto como cuidar, gosto que cuidem de mim. Dou por isso. Nos pormenores mínimos. Se calhar, só eu os vejo. Não importa. Importa é o que sinto.
Levam-me a casa vezes sem conta. Já não conto nem têm conto. O que conto é que continuem por muito tempo. Porque é uma bênção.
E não há ninguém que me deixe à porta e que não espere que eu entre, feche a porta e acenda a luz.
Entro. Fecho a porta e acendo a luz.
Subo as escadas. Abro a porta. Num rompante surge-me a Pitanga no tapete. Sôfrega.
Quase tanto como cuidar, gosto que cuidem de mim. Tenho a certeza de que a Pitanga acha que mais que cuidar, gosta que cuide dela. Estamos em sintonia.
Eu cuido, ela gosta de ser cuidada.
Pego nela ao colo. Como quem hoje de mim cuidou sem que tivesse sequer percebido.
É tão fácil cuidar de alguém…
Chove. Há dias em que escapo por entre os pingos da chuva. Hoje foi dia.

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