segunda-feira, 24 de março de 2014

me confesso uma benfiquista elástica

Este é um momento emocionante para quem é benfiquista, vai ao estádio, ouve o hino do seu clube, e com quarenta e nove mil pessoas, ( hoje foi assim ) ergue-se da cadeira, estica o cachecol bem alto e canta.
Há uma energia maravilhosa que se sente no espaço do jogo, retângulo e toda a envolvência. E é lindo...
Nasci benfiquista. O meu pai, minha mãe, os meus tios, alguns amigos do meu pai eram benfiquistas. Todos gostavam de futebol até à dor. E a todos reconheci sempre uma grande capacidade para o sofrimento, defendendo as cores do seu clube até aos (des)limites do (ir)razoável.
Cresci assim. Se bem que tinha a meu lado um educador mais velho que pai e mãe, homem sensato, ponderado, corretíssimo e inteligente que não ia em futebois. O máximo para ele era uma simpatia pela Académica de Viseu porque nasceu nesse distrito; por arrastamento, da Académica de Coimbra ( lembrei-me tanto dele, hoje! desculpa avô Carvalho mas contra o Benfica eu não tinha escolha ) e sabe-se lá porquê, também simpatizava com o Belenenses. Ora uma pessoa assim, gosta do desporto duma maneira mais ampla e não de clubites. Não cai em cenas menos bonitas, discussões mesquinhas e inúteis, não arranja ódios de estimação, não sente pavor da segunda-feira e das bocas dos colegas do clube que está em competição directa com o seu, não faz taquicardia, nem lhe sobe a tensão, não gasta dinheiro em bilhetes, cachecois, viagens, bifanas, imperiais. Não diz asneiras ao árbitro e não é treinador de bancada. Não engole sapos quando a sua equipa perde porque não tem clube, não é do Benfica até debaixo d' água...
Ao longo da vida foi assim a minha sina. Gostar de futebol e acompanhar o sô Santos a tudo quanto era jogos de futebol, basquete e hoquei, sempre de olhos postos nos encarnados, aplaudindo ou chorando.
Em Torres Novas fiz-me sócia dos amarelos, ou seja, do Clube Desportivo de Torres Novas, tinha cadeira comprada e cativa no estádio de futebol e em determinada fase da minha vida todos os domingos ia ver os jogos dessa equipa, ora em casa, ora fora. Bem sei que as equipas, futebol, andebol, basquete e hoquei, nada tinham a ver com o Benfica, mas eram da terra onde eu vivia, da terra dos meus filhos.
Eu vivia naquela terra participando a todos os níveis da vida da terra. E via tudo o que me era dado ver, em todas as modalidades desportivas.
Casei com um sportinguista e não foi drama nenhum. Cada um respeitava o outro e os seus gostos, taras e manias. Ao estádio de Alvalade fui ver jogos do Sporting, muito antes de ver os jogos do Benfica na Luz. Nos anos em que o Sporting foi campeão, acompanhei o sportinguista lá de casa, indo para a rua comemorar com toda a sinceridade.
Quando o Benfica foi campeão há uns anos atrás, sei lá, talvez oito ou nove, dez, enfim, há mais de sete, o sportinguista acompanhou-me e à cria mais velha até ao Marquês de Pombal onde a família benfiquista comemorava assim o seu triunfo.
Houve porém uma fase da minha vida em que nem o Benfica ganhou nem eu. Foi portanto sempre a perder e eu desinteressei-me de actividades desportivas com carácter quase obrigatório. E de outras.
Como veem, já passei por várias fases, porém sem ser camaleão.
Portanto, esta tenho sido eu, a benfiquista que algumas vezes chega à dor com os insucessos do seu clube, outras se alegra até à emoção e muitas vezes se torna elástica porque o desporto está acima de clubes. E é lindo nas várias modalidades. E as pessoas valem muito mais a pena que as clubites e eu gosto demais de pessoas para me colocar de costas voltadas para elas por causa de um clube de futebol.
Mas, nos últimos tempos tenho sido desafiada a ir ao estádio. E o que de início me parecia um entretimento, uma festa de cor e som, de habilidade, aos poucos foi crescendo e tornando-se muito mais. Um momento alto da minha semana. Uma paixão ( de novo ) que tinha perdido quando deixei de ir com sô Santos.
Hoje, a caminho da Luz, dei comigo nervosa e preocupada. É preciso ganhar porque se o fizerem, serão campeões. Há o exemplo do ano passado em que o Benfica morreu na praia, várias praias. E quando o hino ecoou e se espalhou pelas almas dos benfiquistas eu senti também essa energia maravilhosa que se espalhou.. E quando os encarnados marcaram o primeiro, o segundo, o terceiro golo, eu pulei da cadeira, fiquei em pé e dei saltos como antigamente quando assistia a jogos.
E já estou a pensar no próximo jogo em casa.
Se sou uma boa adepta? Não sei o que é ser uma boa adepta mas sei que sou com certeza alguém que respeita o seu clube e todos os outros que com ele se confrontam. Porque a minha forma de estar, pode e deve ser elástica sobretudo quando tenho familiares e amigos de outros clubes, como o Sporting e o Porto. De mim ninguém disse, diz ou dirá, que recebeu um e-mail, um telefonema, uma publicação no facebook, rebaixando, humilhando o seu clube porque respeito é bonito e eu gosto e sei colocar-me no lugar do outro.
Se o Benfica vai ser campeão? Provavelmente. E se assim for, está a parecer-me que vou comemorar para o Marquês, não com o tal sportinguista mas poderá ser sozinha, com benfiquistas ou quem sabe com sportinguistas ou portistas que não tenham mau perder.
Se houver um azar, vários azares, como o ano passado, paciência. Não vou descontar no primeiro que me aparecer.
Como hoje ouvi um benfiquista dizer à saída do estádio, o que é preciso é ganhar um jogo de cada vez...

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