Surpreendo-me com a capacidade para suportar as contrariedades com que a vida nos desbrinda: Sim porque da vida a gente espera um brinde constante e não agruras. Se não porque raio vivemos? Se é para sofrer...
Desculpem o desabafo, mas isto faz-me lembrar um tempo muito distante. Na avenida brasil. No colégio, sala da menina Piedade. Eu descobrira pouco tempo antes que afinal as pessoas não eram eternas. E que havia gente muito próxima de mim que sofria. Tinha uma colega, irmã do Rui Isaías e do Emídio que tinha uma deficiência física e se deslocava numa cadeira de rodas. E não sei se porque era boazinha apesar da traquinice, ou se porque desde esse tempo a injustiça me fazia chorar, gritar, desafiar, perder o medo, eu protegia a Claudina que era bem mais velha que eu mas que frequentava a mesma classe. E foi ela que me disse que as pessoas morriam. E eu lembro-me de lhe ter perguntado, porquê. Pois se era para desaparecerem para que nasciam. Até essa altura apenas me confrontara com os cães que tinhamos em casa e que por andarem sempre soltos, por vezes atravessavam a avenida e eram atropelados.
Com a realidade que a Claudina me presenteara os meus medos aumentaram. Acrescentei aos outros todos, mais o medo de ver morrer os que amava. Eu já tinha medo que chegava para fazer da minha pequena vida, um drama, não fosse rir-me de dia e troçar dos medos da noite. Do que não se explica. Naquele tempo, quer dizer, será que era só naquele tempo? acreditava em almas de outro mundo. E tinha medo dos " condenados ", do uivo dos cães, dos galos que cantavam fora da meia-noite e houve um tempo que tinha medo de adormecer sozinha e de luz apagada e a dona Celeste fazia-me companhia até adormecer. Era muito kanuca, com 3, 4 anos, mas lembro.
Mais tarde tive outros medos de me fazerem suar, taquicárdia, chorar, desesperar até ao pânico. Afinal vivi a vida perdida de medo de a viver, mas ainda assim, vivendo-a. Houve um tempo que não era capaz de ficar sozinha. Em lado algum. Frescuras que nem psiquiatra resolveu, aquele que adormeceu a ouvir-me, e eu com vontade de o comer numa fatia de pão mas divertida mesmo assim porque p'ra sempre poderia contar à boca cheia, sim que este segredo nunca o seria, só até sair daquelas quatro paredes, que estava a dar com o senhor em doido e ele coitado, preferiu passar-se para o mundo dos sonhos que pesadelo já bastava o meu. Ou eu...
Que barrigada de riso já tenho tido à pála do sr. doutor. Não digo o nome porque ele não teve culpa. Não teve pedalada para uma doente como eu. Percebo-o.
Mas voltando aos medos, perdi-os. Quase todos. Há uns anos atrás. Assim, como que num clique. Um estalar de dedos. Magia. Sobrevivência. Que o que tem de ser tem muita força e apesar de não ter vontade de a fazer não tenho outro remédio. E a vida é tão gostosa que de cobardes não reza a história e eu tenho uma para viver.
Eis senão quando, assim a ver notícias um barco de cruzeiro vai para as urtigas. Jamais me passaria pela cabeça noutros tempos fazer um cruzeiro. Que pavor!!! Mas nos tempos que correm vi essa possibilidade e fiquei bem animadinha. E agora como é que fica?
Água de 15 graus. Nadar? E eu sei lá salvar-me? Ando há 56 anos a tentar escapar por entre os pingos da chuva mas nem sempre estou a salvo...
E eis senão quando, uma pessoa muito querida, viaja de avião. E não tem como comunicar. E passam quase 24 horas sem notícias e percebo que não estou curada. O medo toma conta de mim. Instala-se. E corroi.
Surpreendo-me com a minha capacidade para resitir a tantos medos.
Surpreendo-me com o coração também.
Julgava-me curada mas afinal, uma vez medrosa para sempre com medos.
Desculpem o desabafo, mas isto faz-me lembrar um tempo muito distante. Na avenida brasil. No colégio, sala da menina Piedade. Eu descobrira pouco tempo antes que afinal as pessoas não eram eternas. E que havia gente muito próxima de mim que sofria. Tinha uma colega, irmã do Rui Isaías e do Emídio que tinha uma deficiência física e se deslocava numa cadeira de rodas. E não sei se porque era boazinha apesar da traquinice, ou se porque desde esse tempo a injustiça me fazia chorar, gritar, desafiar, perder o medo, eu protegia a Claudina que era bem mais velha que eu mas que frequentava a mesma classe. E foi ela que me disse que as pessoas morriam. E eu lembro-me de lhe ter perguntado, porquê. Pois se era para desaparecerem para que nasciam. Até essa altura apenas me confrontara com os cães que tinhamos em casa e que por andarem sempre soltos, por vezes atravessavam a avenida e eram atropelados.
Com a realidade que a Claudina me presenteara os meus medos aumentaram. Acrescentei aos outros todos, mais o medo de ver morrer os que amava. Eu já tinha medo que chegava para fazer da minha pequena vida, um drama, não fosse rir-me de dia e troçar dos medos da noite. Do que não se explica. Naquele tempo, quer dizer, será que era só naquele tempo? acreditava em almas de outro mundo. E tinha medo dos " condenados ", do uivo dos cães, dos galos que cantavam fora da meia-noite e houve um tempo que tinha medo de adormecer sozinha e de luz apagada e a dona Celeste fazia-me companhia até adormecer. Era muito kanuca, com 3, 4 anos, mas lembro.
Mais tarde tive outros medos de me fazerem suar, taquicárdia, chorar, desesperar até ao pânico. Afinal vivi a vida perdida de medo de a viver, mas ainda assim, vivendo-a. Houve um tempo que não era capaz de ficar sozinha. Em lado algum. Frescuras que nem psiquiatra resolveu, aquele que adormeceu a ouvir-me, e eu com vontade de o comer numa fatia de pão mas divertida mesmo assim porque p'ra sempre poderia contar à boca cheia, sim que este segredo nunca o seria, só até sair daquelas quatro paredes, que estava a dar com o senhor em doido e ele coitado, preferiu passar-se para o mundo dos sonhos que pesadelo já bastava o meu. Ou eu...
Que barrigada de riso já tenho tido à pála do sr. doutor. Não digo o nome porque ele não teve culpa. Não teve pedalada para uma doente como eu. Percebo-o.
Mas voltando aos medos, perdi-os. Quase todos. Há uns anos atrás. Assim, como que num clique. Um estalar de dedos. Magia. Sobrevivência. Que o que tem de ser tem muita força e apesar de não ter vontade de a fazer não tenho outro remédio. E a vida é tão gostosa que de cobardes não reza a história e eu tenho uma para viver.
Eis senão quando, assim a ver notícias um barco de cruzeiro vai para as urtigas. Jamais me passaria pela cabeça noutros tempos fazer um cruzeiro. Que pavor!!! Mas nos tempos que correm vi essa possibilidade e fiquei bem animadinha. E agora como é que fica?
Água de 15 graus. Nadar? E eu sei lá salvar-me? Ando há 56 anos a tentar escapar por entre os pingos da chuva mas nem sempre estou a salvo...
E eis senão quando, uma pessoa muito querida, viaja de avião. E não tem como comunicar. E passam quase 24 horas sem notícias e percebo que não estou curada. O medo toma conta de mim. Instala-se. E corroi.
Surpreendo-me com a minha capacidade para resitir a tantos medos.
Surpreendo-me com o coração também.
Julgava-me curada mas afinal, uma vez medrosa para sempre com medos.
2 comentários:
olá. Eu penso o seguinte, ao ler este texto.. ter algum medo é bom, porque e como diz na parte final.. as pessoas preocupam-se quando não recebem notícias de outras pessoas e o medo faz com que as pessoas tenham sentimentos e ter sentimentos é bom. pior seria, se a Maria Clara não tivesse sentimentos e isso tem de sobra. É isso que a tornou num bom coração. beijos e um abraço.
Obrigada Nuno. Sempre presente, sempre opinando...
Um abraço, assim, do tamanho do mundo.
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