sábado, 12 de março de 2011

a voz do sangue

foto retirada do google
Esta é uma imagem de Porto Alexandre. Uma localidade junto a Moçâmedes, no Sul de Angola.
O avô Carvalho viveu aqui muitos anos. Trabalhava para uma empresa que construía pontes, fábricas, armazéns e outras obras grandes. Muitas da obras importantes para o desenvolvimento de Angola passaram-lhe pelas mãos.
Anualmente, deslocava-se a Luanda, sempre por altura do Natal ou se acaso precisasse caso de doença, o que aconteceu quando esteve internado na Casa de Saúde de Luanda, perto do Miramar e do cemitério novo ( Alto das Cruzes ).
Chegavam a Luanda notícias de que tinha uma família em terras do Sul.
Eu que lhe escrevia cartas de saudade profunda, nunca ousei questioná-lo. Mas não fui a única. Convivia-se com essa possível realidade de uma forma superficial e confortável. Penas que não se vêm, não se sentem.
Eu não. Tinha uma grande curiosidade. EVerificação ortográfica propus-lhe uma viagem até Porto Alexandre, nas férias. Para conhecer o sul, poder estar com o homem da minha devoção, o ser que mais admirei na vida e conhecer a tão falada família.
Saltou essa parte e eu fiquei triste e desiludida. Percebi que ainda mantinha de mim a imagem da criança que não vai entender. E havia também a questão rácica, que provavelmente era a causa mais preocupante para ele. Não para mim. Não insisti. Quando voltou a Luanda e me pediu que o levasse a uma papelaria para comprar canetas de ponta de feltro,( marcadores ), tive a certeza de que na sua vida havia crianças em idade escolar como a Paula o era na altura. E não me enganei.
Em Portugal, depois de ter saído de Moçâmedes numa traineira e feito a viagem até ao Algarve nestas circunstâncias, escreveu-me e finalmente pude ler a sua história. Visitei-o em Lisboa onde se encontrava numa pensão que o IARN lhe arranjara. E mais tarde visitei-o em Vilar, a sua terra, na Beira Alta.
Tinha assim dois tios, bem mais novos que eu. Um rapaz e uma menina. Ela era dois anos mais nova que a minha caçula. Mantive algum contacto até que o avô Carvalho morreu. Depois, quando a Manuela, minha tia, casou, falei com ela, algumas vezes ao telefone. Convidou-me para o seu casamento. Mais tarde, soube que saíra de Portugal, para norte. De vez em quando o mano Zé contacta com o irmão da Manuela, nosso tio.
Sempre foi muito estranho este parentesco pois eles têm idade para ser meus sobrinhos, e nunca foi próxima a nossa relação, não por eu não querer, mas porque a vida não permitiu. A distância foi a grande causadora, o facto de eu ter uma família para cuidar que me absorvia completamente, e o avô já não existir como elo de ligação.
Pelo Natal há notícias. O mano Zé faz a ligação entre eles e eu.
Há dias recebi uma notícia. A Manuela estava no facebook. Fiquei feliz. Fiz-lhe o convite para que me adicionasse. Neste momento está no grupo da família. Tia. E eu estou na página dela como sobrinha.
Acho, que ainda vamos a tempo. De sermos família.
Para isso preciso de a conhecer. De lhe reconhecer os traços. De saber como foi ser filha do meu avô Carvalho. De conhecer os netos do avô, seus filhos. Ou não... dizem que a Voz do Sangue faz o resto.
Estou muito feliz e em paz. Olho para cima e adivinho um avô Carvalho mais apaziguado.
Contas feitas. Devia-lhe isso. Devia-me isso.
Assim, eles o queiram...

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