O metro é o transporte mais usado pela maioria da população durante a semana. Pelas minorias, ao fim de semana.
Eu uso-o de qualquer maneira. Pertenço às maiorias e também às minorias e não estou nem aí para as correrias, encostos, encontrões, cheiros que fedem, caras ensonadas, antipáticas, infelizes, pedintes que fazem profissão e assinam o ponto diariamente, sem abrigo, engravatados, ordinários, larápios, chulos, prostitutas, funcionários públicos, estudantes, executivos, desempregados, reformados, bêbados, turistas. E outros...
Não estou nem aí. Uso e abuso. E gosto de usar e de abusar. O metro é rápido. E mais barato que autocarro, eléctrico e taxi.
Tem o senão de ser que nem toupeira, mas ainda que claustrofóbica, na verdade nunca me lembro que vou debaixo da terra, o que é bom. A menos que mo lembrem.
E desta vez fui lembrada. E por quem?
Por dois mwangolés que iam sentados nos lugares da frente. Ele, jovem, de ténis, jeans e t-shirt amarela que dizia, Força Angola, ela já kota, talvez mãe dele. Lenço na cabeça, saia parecia pele de cobra, cinzenta, blusa cor de rosa, lenço nos ombros a servir de xaile e sabrinas com brilhantes. Como sei? São muitas viagens de metro. Muita observação. Muita curiosidade. Muito tempo sem nada para fazer à procura de um motivo qualquer que distraia o olhar e o pensamento para não ficar com cara de mete nojo a disfarçar que é natural ir a olhar e a desviar olhares.
Ainda estava na observação deles, que é como quem diz, ainda não me tinha posto bem neles quando começam a conversar. O sotaque os denuncia, ainda que a t-shirt já o tivesse feito antes. Se bem que não há nada que diga que um guineense ou moçambicano não possa usar uma t-shirt que diz Força Angola. O sotaque da banda percebe-se ao longe e não há dúvidas nenhumas quando é um mwangolé que está a falar.
- Porquê afinal a Rosa não quer apanhar metro? É mais fixe, então? ele.
- Deve-lhe assaltar um medo. Ela me disse que apanha o autocarro. Aqui tem o 36. Vai até no Campo Pequeno, depois apanha o outro lá p'rás banda dela. Ela.
- Eu num tenho medo de metro. O autocarro demora bué. Dá muitas voltas. Só se for para olhar a cidade. Gosto mesmo de andar de metro.
Apeteceu-me estender o braço abrir a mão e bater na mão dele numa de, apoiado. Eu também de vez em quando gosto de regressar a casa de autocarro, mesmo que mais demorado, apenas para observar a cidade. E evidentemente quando é tarde, porque pára mais perto de casa.
- Mas aqui se há um próbeléma tamos lixados, disse ela, abanando a cabeça para cima e para abaixo. Ficamos aqui em baixo. E riu.
- Pois é. Mas não ficamos aqui no buraco. Vêem-nos buscar. Eles nos tiram daqui.
- Nos tiram né? Perguntou ela desconfiada.
- Ya. Nos tiram sim.Temos é que esperar aqui dentro. E ao dizer isto ele sorri nervoso.
E eu nervosa fiquei. Afinal estamos mesmo lixados se tivermos um acidente. Mas tal como ele, penso que eles, sejam lá quem forem, vêm-nos buscar.
Enquanto não, acho que teria um acesso de claustrofobia com pânico à mistura e imagino em que estado ficaria até que me tirassem do buraco que seria um qualquer sítio onde o metro parasse.
Nunca penso nisso enquanto ando no transporte mais usado pelos utentes. E ainda bem.
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