Ao fim de dois dias de voluntária clausura, resolvi sair, porque elas não matam mas moem e diz que os reformados não devem fechar-se. Que morrem de morte morrida. P'ra mais e apesar das penas que a minha vida tem, não gosto deste penar porque não sou pássaro de gaiola. Mesmo que seja dourada.
A propósito, acho que devem ir ver o filme pois é muito giro. Saem de lá a falar francês com sotaque de tuga, mas até se torna um charme, p'ra quem gosta.
Mas estava eu dizendo que pus pés ao caminho e fui aqui ao dobrar da esquina que não é senão uma ponte que separa o Olival, de Odivelas e da Póvoa e que saltando a ponte, logo ali de frente do nosso nariz avistamos uma loja de chineses e chinesices e outras modernices que até berram de tanta foleirice, arrepiam de tanto mau gosto e tão duvidosa qualidade, mas fazer o quê?
Pobre é assim mesmo, não vai para a Comporta, mas dá o dito e três tostões por uma grande loja de chineses. Eu também. Há sempre uma chinesice que outra loja não tem. Tinha feito uma lista de coisitas que queria da dita loja. Velas, afia-lápis, papel de alumínio e aderente, um cesto em verga para os colares que andam por todo o lado e já não há quem os consiga arrumar. Ah, um tapete daqueles que parecem mantas, também.
Procurei por toda a loja e nada. Devo dizer que entrei ali duas vezes apenas. Vi um chinês e dirigi-me a ele.
- Dá-me uma informação por favor? é que foi mesmo assim porque quando toca a ser bem educada, sou mesmo.
Nem olhou para mim. Repeti, dá-me uma informação, por favor?
O homem dos olhos em bico, virou a cabeça de repente, arregalou os olhos, desapareceram os bicos, pareciam saltar das órbitas e disse neste tom:
- FALA! alto, quase a gritar-me. A colocar a sua pupila na minha, directamente. Porque eu não respondi de imediato, insistiu, FALA !
- FALO, sim. Diga-me onde estão os tapetes, falei, puxando o queixo para a frente e empinando o nariz. Sem pestanejar. Sem desviar a minha pupila da dele. Sem vacilar.
Ele apontou outro compartimento enorme e desconhecido para mim, É ALI !
Obrigada, ainda disse e lá fui eu rezando pais nossos tortos, imaginando aviões com os dedos e meia dúzia de palavras impróprias como lhes chamava eu, quando me ajoelhava no confessionário do padre Luís na igreja de S. Paulo, na missa das seis, de domingo.
Também não achei os afias e por isso na caixa perguntei ao outro chinês, eles são mais que as mães naquela loja, onde encontrava o dito afia-lápis. Muito calmo e educadamente falou com a chinesa que estava mais perto, apontou e lá foi ela em busca do que eu precisava. Simpáticos estes dois. O homem fez-me a conta a tudo e sorriu. Gente, os chineses sorriem.
Sorriu-me, recebeu-me o cartão MB , fez a operação, entregou-me o saco e atendeu outro cliente de seguida.
Saí da loja, contente com as minhas compras. Mas pensativa. Porque será que a comunicação com os asiáticos é sempre tão difícil? Não é preconceito.
Trato-os por chineses porque eles o são. Não lhes conheço o nome. Tenho de os identificar de alguma forma. Mas hoje aquele chinês ia-me tirando do sério. Não por ser chinês mas por me gritar. Anda tudo doido. Qualquer dia os vendedores andam de Gê3 a impingirem-nos os seus produtos.
Também não admira, pois com a crise que para aí vai, morra quem se negue.
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