segunda-feira, 12 de agosto de 2013

já não se fazem poemas como antigamente

Nesta noite cálida de domingo, ai a minha vida, está bem está, cálida é favor, quente, sim, que está a escaldar e isso não me parece nada bem pois que de escaldões percebo eu e não gosto, já hoje foi mais um, se calhar por isso é que me troco toda e de há uns tempos para cá chamo aos sábados domingos, vai-se lá saber porquê, mas adiante, dizia eu que nesta noite quente de sábado, indo eu pé ante pé, no caminho do lar, outra, pé ante pé, han?! chinelando displicentemente, no caminho de quê? Lar? 
Estou mesmo a querer tapar o sol com a peneira para que passe só por entre os furinhos já que hoje esteve abrasador e isso cansa as vistas e a pele e torra a paciência a um santo, portanto a ver se nos entendemos, ia chinelando no caminho de casa, quando subitamente, mas é que foi mesmo, aqui nada a registar, e vamos em frente que atrás vem gente e pode não ser de confiança, não vá o diabo tecê-las, dizia eu que subitamente chega até mim um aroma intenso que a brisa suave da noite, tipo lufada de ar fresco, me traz. 
Inspiro e tento reconhecê-lo. Hun, tal e coiso, coiso e tal. Alfazema. Bingo! Mais cinco, que nem sempre acontece. Troco alfazema com alecrim e vice-versa. E às vezes também o jasmim é trocado. Mas não. Desta vez não me enganei. É mesmo alfazema. 
Como aquela que vem em saquinhos para a gente oferecer no Natal, de presente aos menos íntimos que esses mandavam-nos dar uma volta, coisas de velhos, o que é que é isso? Estás a ver-me de óculos ou quê? Oh licas, estou mesmo, que já os uso há mais de uma década e não vejo melhoras nem milagres por isso aguenta fofa, sim, que homem que é homem (?) não aceita presente que está na cara é para mulher, rebobino e digo mais uma vez, que sim, fofa, quando estiveres prescrita que é como quem diz, a mijar para as botas, troco o teu perfume preferido da Douglas por um saquinho de alfazema, e levas com ele, ah pois é, que guardado está o bocado para quem o há-de comer e ai comes comes, oh se comes.
Eu juro que tento, já várias vezes, hoje, tentei fazer um poema à noite quente, à brisa suave e fresca de aroma a jasmim, caneco, não é jasmim nem alecrim, é alfazema, mas como consigo eu inspirar-me? Se a alfazema está plantada num jardim (?), que não é o de Belém, nem da Estrela nem o Botânico, mas num reles canteiro das bombas de gasolina antes da ponte que hei-de passar para chegar ao burgo onde descanso o cansaço e os sonhos e também os pesadelos que é como quem diz, onde habito, ah sim, a dita ponte de que tenho falado muito ultimamente, pudera, a gente fala do que conhece, e já agora, esclareço que vou passar a dita, se Deus quiser e há-de querer, que estou farta de ficar a meio de pontes como aqueles indecisos que já todos conhecemos pelo menos uma vez na vida, que fazem pelas pernas abaixo por não escolherem entre dois ou mais, o wc certo.
Era mais fácil sim, muito mais, se o mote para o poema tivesse como poiso certo, local do " crime " sei lá, o castelo de S. Jorge, um beco de Alfama, as escadinhas de São Cristovão, beira-rio, rio Tejo, o parque Eduardo Sétimo, ops! se calhar menos não? Pronto, pronto, um qualquer parque da cidade grande, uma qualquer colina, uma qualquer ruína, mas Odivelas? Só que é o que temos e não posso renegar a localização do canteiro de alfazemas, da brisa fresca e da minha passagem por isto tudo. 
Posso dizer que quando senti o cheirinho conhecido, mais a brisa, porque isto é tudo poesia da verdadeira, já que mexeu com os meus sentidos e me beijaram amigas me dizendo no ouvido que estou viva da silva, quer dizer, dos santos, olhei por mim abaixo e disse para com os meus botões, mas primeiro procurei por eles não os encontrando na túnica transparente e aberta quase até ao umbigo, mas num esforço tramado, porque para falar com botões estou cá eu numa cisma que chega a ser paranóia, touché, achei algures, adiante, dizia eu então, neste conversê viciante, que achei estava perante um poema daqueles à séria para final d'um dia quase perfeito, mas quando procurei pelo caderno e pela esferográfica percebi que não há poesia possível quando uma criatura chega da praia às nove da noite, carregada de sacos, dois deles do supermercado com comida de gata, linhaça, iogurtes, leite de soja e água gelada porque está um calor do caraças e o corpo pede líquidos e água é do melhor, tem uma larica gigante e ainda tem de passar pontes e olhar para os lados, não vá o diabo tecê-las.
Qual poema, qual carapuça.
Olhem, quem quiser que o faça, ao poema. O mote eu dou e não diga que vai daqui.

2 comentários:

persiana fechada disse...

Gosto dos seus textos. escolheu a profissão errada. Mas quem sabe, se um dia não escreve um livro. já o é, mas deveria ter sido escritora profissional. Eu delicio-me de cada vez, que cá venho. De facto, ontem esteve muito calor. hoje está mais fresco. beijos e um abraço

Agostinho disse...

É claro que não! Não é pelo papel e pela esferográfica se terem transfigurado em teclas de computador, linhas e linhas de carateres virtuais alinhados em carreirinhas, sem métrica nem rima, que a poesia, tal como antigamente, deixa de ser. Basta o aroma lá estar. Pode ser alfazema.
Kiri muene.

AJ