terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

carnaval ou talvez não


Terça-feira de Carnaval.
O sol já ia alto quando saí de casa. Para trabalhar.
Quando dobrei a esquina da escola percebi que ali era feriado. É sempre feriado neste dia, ali e em todo o lado. Chamem-lhe o que quiserem. Tolerância de ponto, a despachar ano após ano, a sair em Diário da República, ou outra coisa qualquer, mas hoje costuma ser feriado. Não é, mas devia ser como nos outros carnavais. Bem sei que houve um ano de excepção. Apenas um. Roubado que foi pelo outro senhor da mesma cor e do mesmo Carnaval apalhaçado em que nos querem forçar a sambar.
Dobrei a esquina da escola. Dobro sempre a esquina. Hoje em silêncio.
Percorro a cidade a caminho do viaduto, na maior solidão. Como se fosse domingo ( imagino eu, que não me perco por estas bandas ao domingo de manhã ). O viaduto parece-me muito mais íngreme e longo. Estou quase a chegar ao cimo e surpreendo-me com as amendoeiras que floriram em três dias, ou sou eu que não reparo. Pensando bem nem me tinha apercebido que havia ali amendoeiras, agora em flor. O telhado da quinta das Vieiras está branco como a neve, do gelo da noite. Porquê que não neva nesta região? Era muito mais giro. Trazia pessoas. Era tudo diferente. Foi uma festa quando, das três vezes, apenas três, desde que vivo nesta terra, nevou. Nem queria acreditar. Olhei para o outro lado do viaduto e avistei a casa daqueles dois que no sábado encontrei no Lidl. Todos bem dispostos. Mais anafados e velhos. Mas amiguinhos e bem dispostos. E não é que fiquei com cara de tacho? Pois se me juraram a pés juntos que eu vi, que ele tinha dado às da vila diogo com uma colega, o óbvio, o mais óbvio, a que está ali mesmo à mão que nem é preciso procurar muito, e que não acorda desgrenhada, nem põe o avental, nem agarra no aspirador, nem lhe doi a cabeça...
O que são os boatos!
- Estás boa? - Estou, disse eu - Mas estás mesmo boa? perguntava ela. A minha filha disse-nos que te viu hoje logo de manhã, às 9 horas, no Modelo. E a mim só me apetecia perguntar-lhe - E tu? Não devias ter um par de cornos a enfeitar-te a cabeça? Porque raio a tua filha, do nada, te diz que me viu se passaram anos sem que convivêssemos? Isso é que vai aí uma quadrilhice. 
Ah, viu-me com o mano Zé e pensa que estou de namorado novo. Só pode. Não digo nada sobre o assunto. Há-de lá chegar com montes de truques para que eu não perceba. Conheço as peças.  
A casa está na paz de Deus como toda a cidade. Dorme-se. Indiferente à minha presença e ao meu cansaço. Ande eu o que andar chego sempre lá acima a deitar os bofes pela boca. Dois gatos brincam um com o outro indiferentes à minha passagem. Um igualzinho à minha Pitanga, mas mais gordo, o raça da gata come gambas com atum, a sortuda, e ainda assim não engorda. O outro era um amarelo listado giríssimo. Não fosse eu saber por experiência, e tentava ter um gato amarelo para fazer companhia à Pitanga mas ela jamais aceitará. 
Cheguei finalmente ao meu destino. A boleia que me levará para o local de trabalho. Nem um automóvel se cruzou ou  passou por mim. Nem uma pessoa eu vi desde que saí de casa. Apenas na pastelaria algumas pessoas tomando o pequeno almoço, nada mais.
Hoje é terça-feira de Carnaval. Na verdade se não fosse trabalhar nem sei o que faria.Olhem, se calhar eles têm razão. Feriado? Porquê? Costume popular? Quem liga a isso? E depois, quê dele o dinheiro para irmos para a gandaia? Assim como assim, o meu subsídio de refeição está ganho. E amanhã já é quarta-feira. De cinzas...diz que é dia de não comermos carne. E eu que perguntei qual a  sopa que no café do bruno terão amanhã, e feliz da vida, com os olhos a brilhar, excitadíssima com a novidade, a empregada que se tornou simpática desde que servem refeições disse de uma só vez - sopa da pedra.
Estão a ver não estão?  

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