sexta-feira, 8 de abril de 2016

o Padre Luís partiu :( ...

Vi agora. Li agora. " O Funeral do "meu" Anjo da Guarda (Padre Luís Salvan) é amanhã (quinta-feira, 07 de Abril de 2016), às 10:00 h (de Itália, e às 09:00 h de Portugal. Do Convento do Frades Capuchinhos de Conegliano irá para o Cemitério de S. José, em Conegliano (Treviso (Véneto (Itália))), para o Descanso Eterno..."
O Padre Luís partiu. 
E não pude deixar de me arrepiar à notícia. E não impedi uma lágrima de brilhar no meu olhar. E um aperto no meu coração. E não pude evitar um Ohhhh! Coitadinho...
Mas não. O Padre Luís não foi um coitadinho, não. Viveu nas suas escolhas. Dedicou-se à religião, à fé e às pessoas. Viveu feliz. 
Faz parte da vida de muita gente. De muitos paroquianos. De muitos casais. De muitas meninas e meninos que hoje têm a minha idade. E por ele foram tocados.
O Padre Luís, faz parte do imaginário de angolanos e portugueses que viveram em São Paulo, Bairro Operário, Bairro do Cruzeiro, Maculusso, Ingombotas, Vila Clotilde, Vila Alice, Caop, Marçal, Sambizanga, Cuca. E de todos os que com ele privaram dos mais variados bairros de Luanda. 
O Padre Luís era um homem abençoado por Deus, rosto de anjo e voz de santo. Que espalhava a fé e o bem. 
Dele recordo-me, recordo-o, era eu muito pequena. Aluna do colégio. Da primeira classe ( 6 anos ). Todas as semanas lá ia para uma aula de catequese. Distribuía santinhos ( preciosos para mim ) e pregava a religião. O bem. A fé. Fantasiava, embelezando as palavras e tornando-as mais fascinantes. Fascinava-me com a sua voz e o encanto da cor dos seus olhos. E das suas vestes castanhas de capuchinho. Dele, sei a história do Pinóquio contada pela primeira vez. Passeando-se pelas carteiras, entre alunos completamente conquistados por um padre que dava vida a um boneco de madeira mentiroso. A cada semana se movia com leveza por entre nós, espalhando a fantasia de histórias de encantar.
Quando teria talvez 12 anos e já com a 1.ª comunhão feita era a ele que me confessava, aos domingos e dias santos. Na Igreja de São Paulo. Conhecia-me de ginjeira e sabia sempre aplicar-me a devida penitência aos pecados, iguais, de semana a semana - Disse palavras impróprias ( asneiras ), desobedeci, menti aos meus pais e fui mal educada. Fiz partidas. Discuti, bati nos meus colegas - Ele, por entre a rede que nos separava, sorria, chamava-me - minha filha - mandava-me rezar o acto de contrição e aplicava-me a dose certa para uma semana de arrependimento. 
Baptizou a minha irmã caçula quando eu tinha 14 anos. Vi-o casar muita gente das minhas relações. Assisti a muitas cerimónias. Procissões e funerais a que presidia. Cruzava-me com ele na rua. Sempre me sorria e falava. 
Há cerca de 25, 30 anos encontrei-o em Fátima. Tinha vindo a Portugal de propósito, para o encontro dos retornados, que acontecia ( não sei se ainda acontece ) no primeiro domingo do mês de Setembro. Estava rodeado de pessoas de Luanda que o acarinhavam. Fiquei tão feliz por voltar a vê-lo! Que só repetia - Padre Luís, padre Luís! É mesmo o senhor? Cumprimentei-o com um abraço apertado e dois beijos. Ele agarrou-me nas mãos e sorriu-me, como o fizera quando eu tinha seis anos. Quando me confessava ou dizia a missa, poisando o olhar bondoso em mim e em todos nós, que ali íamos. Disse-me que estava em Roma. E fez festas na cabeça dos meus filhos. 
Abençoou-me com o sinal da cruz na minha testa; e eu voltei para casa segura que Deus tinha passado por mim e se detivera para me abençoar.
Nunca mais o vi. Nunca mais dele soube. Até este momento. 
Foram muitos os textos em que dele falei. A cada Natal. A cada Páscoa. A cada lembrança do meu passado de criança estudante. A cada viagem a Luanda e à igreja de São Paulo. A cada confessionário e altar. A cada missa. A cada missionário. A cada história. A cada Pinóquio...
Morreu um homem de bem. Que representava com honestidade e dedicação, a Igreja. Morreu mais um elo ao meu passado, à minha terra, à minha infância, ao meu catolicismo. 
Morreu mais uma doce lembrança do meu imaginário...
O seu eterno descanso e paz à sua alma.

m.c.s.

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