Há uma canção velhinha que diz, " Se esta rua se esta rua fosse minha, eu mandava, eu mandava ladrilhar, com pedrinhas, com pedrinhas de brilhantes,só prá ver, só prá ver meu bem passar..."
Esta rua tão velhinha chamava-se Rua do Saber Andar. Até às bombas da Mobil, tinha asfalto e electricidade. Daí para a frente e até ao Hospital de São Paulo e aos eucaliptos, era de terra batida. Sem candeeiros na rua e luz nas casas.
Chamaram-lhe Avenida Brasil. Puseram-lhe um " do " e passou a ser Avenida do Brasil. Mais tarde, chamaram-lhe Rua do Brasil.
Quando eu nasci a minha casa já tinha luz. Os candeeiros já alumiavam a avenida de terra vermelha. Eram troncos em madeira...
Quando fui para a escola ( colégio Nossa Senhora de Fátima a poucos metros da minha segunda casa onde iniciaram os trabalhos de colocação da conduta da água, a que se seguiu o asfalto. Do muro do colégio, do muro de casa todos os dias ia vendo as manobras dos tractores removendo a terra vermelha. Abrindo buracos. Fechando buracos. Era uma animação para o meu espírito infantil, curioso e sonhador.
Esta é a minha rua. Aquela que me conhece de trás para a frente e da frente para trás. Aquela onde ficou a minha placenta.
Que assistiu às minhas primeiras palavras, gargalhadas, brincadeiras. Aos meus primeiros passos. Que esteve presente em todos os momentos importantes da minha vida de 20 anos.
Levou-me à escola. Levou-me para casa. Abraçou-me em momentos de alegria, tristeza, inquietação. Ajudou-me a crescer em liberdade. E a aprender a ser justa.
Ladrilhei-a no pensamento. E deixei que o amor chegasse. Passeei-o pela rua. Vi-o passar...
Esta rua, a única que é minha porque ali nasci, ali vivi e dali parti há 40 anos já me viu regressar. Já se embelezou só para eu passar.
Quando olho a minha rua, assim, de fotografia, sinto-lhe o chão. O cheiro e o céu. E fica sábado à tarde de novo. O dia da felicidade. Dos papagaios coloridos lançados para cruzarem os céus a competirem com os bandos de pássaros e com os aviões.
Do cheiro do pão acabado de sair dos fornos da padaria Independente. Da cachupa da Dona Arminda. Do bombô a assar junto do bananeiro, um branco velho de cabelo e bigode todos brancos.
Das mornas e coladeiras cantadas e tocadas no quintal da vizinha. Dos jipes preparados para as caçadas de pacaças e veados dos irmãos Necas e Henrique ( vizinhos ).
Das mangas do meu quintal...
Da mãe, do pai, do avô. Das amigas de infância.
Esta é a minha rua. Porque é aqui que eu sei que estou no meu chão. Aquela a que chamo minha numa posse que ninguém ma conferiu mas da qual não abro mão. Só se for para a abraçar de novo.
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