domingo, 8 de outubro de 2017

nem tudo o que parece...

Eu passo por ele quase todos os dias. Na rua de Angola. A caminho do metro. Ou de regresso a casa. Muito de vez em quando entro e avio-me. Legumes e fruta.Tem barba branca, olhos grandes e escuros, sorridentes e bondosos, como os olhos do meu avô, que mo lembram, sempre que o vejo e o cumprimento, ou ele a mim. Tem pele morena e estatura média. Bonito. Pode ter 70 anos. Menos, ou mais. Por vezes veste como europeu, outras, com túnicas compridas por cima de calças largas. Apelando às origens. A Índia. Dizia eu para com os meus botões. As lojas de indianos proliferam. Saem-nos ao caminho a cada esquina e quarteirão. São as antigas mercearias dos Sô Santos deste país. Que deram lugar aos hipermercados, vindo estes estragar o negócio das lojas de bairro. Com a chegada destes estrangeiros reapareceram. E vendem. Menor qualidade e preço. Marcas desconhecidas. Por vezes falta de higiene. Falta de preços nos produtos da venda. Mas vendem. Esta, p' ra mim, é a melhor loja de ´´ indianos ´´ do Olival. Mesmo junto a esta, abriu outra. Ainda não tem um mês. Homens de turbantes vermelhos, na cabeça. Tez muito escura. Olhos negros. Nariz comprido e fino. Sentam-se em caixotes, no passeio. Como o meu ´amigo ' indiano tem hábito de fazer. 
Passei vinda do metro. Vi anonas a 1,75 € e batata doce a 90 cêntimos. Não hesitei. Tirei 2 sacos, servi-me e levei-os para serem pesados.
- Então agora tem vizinhos a estragarem-lhe o negócio? Perguntei. Pois é. São indianos, respondeu - senti ali um indisfarçável desdém. 
- E você não é? Perguntei. Não. Eu sou paquistanês. Senti ali um certo orgulho. Mas uma desilusão se apoderou de mim naquele momento. Acabara de destruir a ideia do conhecimento romântico e global que tenho dos povos. Afinal não basta ter pele morena, olhos escuros, barbas e vestes regionais, lojas de bairro ou esbarrar em indianos - na escola, nas amizades, nos colegas de trabalho, nos médicos e professores - e até nestes novos indianos, comerciantes e recentes no país, para os identificar. 
Para o serem. Às vezes a diferença é só o turbante. Outras, é gigante. No caso é abismal. Porque é comportamental. E eu a dar como certa a sua nacionalidade, embora me perguntasse o que tinha aquela loja de diferente das outras onde não gosto de entrar. É que gosto do paquistanês, ex-indiano, que tem uns olhos divertidos e profundos como os do avô Carvalho, é educado e simpático; e a sua loja para além de não cheirar mal é arrumada e limpa. As anonas são óptimas. Quanto à batata doce, 
amanhã saberei. E porque sou leal, até porque fora de Portugal sou facilmente confundida com paquistanesas, a minha loja preferida de indianos é a do paquistanês. 😉.E assim vai continuar. Mas que foi um balde de água fria no meu suposto conhecimento dos povos, foi. É que já devia saber que nem tudo o que parece, é.

m.c.s.

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