domingo, 3 de outubro de 2010

encontro com a chuva

Chove. Acinzenta-se a cidade num vento frio e inconveniente. Na terra bassa de alegria.
As árvores nervosas oscilam de norte para sul. E as nuvens velozes iniciam a viagem. Sempre o sul no caminho. A rota do viajante.
Onde o termómetro marca uma febre de sol praia e mar. De descanso e de prazer.
Não há volta a dar. Chove hoje e aqui. Numa promessa sádica dos jornais, das televisões, num passar de boca em boca, " que não hás-de ter um bom domingo." Nem um fim de semana prolongado. Laureado. Bem aproveitado. " Para não contares como foi. Ah e nem vais precisar de fazeres figas, não vá o diabo tecê-las..."
Chove e o que te resta é esta verdade. E isso é muito. " Muito pouco poderás dizer. Pensa bem. "
Posso ser o livro por abrir. Do teu escritor preferido. Posso ser aquela série sobre batas brancas ou verdes, ou doutra cor qualquer, hospitais, amores e desamores. Estão lá actores que tu gostas e histórias e profissões que sonhaste. Posso ser o travesseiro onde encostas a canseira de dias desocupados, ocupados, chorados e perdidos, passados.
Posso ser aquele prato que há muito queres saborear e nem dá trabalho fazer. Posso ser o teu sofá, descansa pés, banho de imersão, sais e água perfumada. Posso ser janela aberta para a rua, o monte e o movimento da erva crescida e seca. Posso ser a descoberta neste aparelho pequenino. A informação. A comunicação. Posso ser música de angola, cantada e dançada sob o tapete vermelho da sala. Posso ser gaveta para organizar. Fotografias. Posso ser texto. Palavras.
Rimadas. Ou não. Ao acaso. Confissão...
E telefone. Um alô amigo, sentido, apetecido. Também posso ser sobremesa. Posso ser chá de gengibre e mel. Verniz para as unhas, creme hidratante, máscara para o rosto. Quimono vermelho de motivos africanos, rabo de cavalo, cara lavada, água de colónia e chinela no pé, que ninguém vê. Posso ser criança brincando, correndo na casa, jogando às escondidas com animal que parece gente e se porta melhor que muita gente. Posso ser máquina fotográfica, eternizando momentos fugazes. Posso ser preguiça.
Posso ser manhã desocupada, tarde repousada e noite sem viagem. Posso ser domingo que parece sexta-feira. Posso ser silêncio. Pensamento com o coração. Encontro com Deus. Posso ser apenas reflexão. Respiração...
Chove e o dia promete. Escolhe. Recebe. Depende de ti e de mim.
Por mim, está ganho!

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