domingo, 31 de julho de 2011

bom dia, meu príncipe

foto tukayana.blogspot


Uns perdidos para sempre.
Outros ganhos para toda a eternidade.
Uns longe, outros perto.
Uns que nunca partiram, outros que nunca chegaram.

Eu. Aqui.
No lugar onde tudo está nos seus lugares.
No lugar da paz.

Quero abraçar o dia, como um jardim perfumado abraça as suas flores.
Estou no lugar que escolhi e hoje sou feliz.

Sou mãe, sou irmã.
Sou mulher e cidadã.

Sou abelha rainha.
Bebo deste néctar.
São de mel os meus beijos.
O pólen transporto na brisa que chega até ti,
ausente que estás, de mim.
Tudo o que me dás, faz do meu dia, dias de alegria e muita paz.

Bom dia, meu príncipe!

TRACY CHAPMAN: THE PROMISE

Votos de bom domingo!!!

ainda as festas de Tomar e suas ruas enfeitadas

























fotos tukayana.blogspot

sábado, 30 de julho de 2011

Paradeiro - Marisa Monte & Arnaldo Antunes

haverá paradeiro, para o nosso desejo, dentro e fora de nós?

começando o dia

Hão-de chegar melhores dias. Tenho fé, pois a esperança é a última a perder-se, quando não está já perdida, o que não é o caso. Apesar das desconfianças, sou muito confiada.
Hoje é um novo dia. E é sábado. Mas como o perú eu ando nisto de véspera e tenho ainda o dia de hoje para exorcisar aquela viagem dolorosa, a pior da minha vida. Às quatro menos vinte da manhã, lá partimos num avião suíço a caminho de Acra no Gana. Éramos refugiados viajando na ponte aérea. Depois do pára, arranca que foi essa viagem, à hora de almoço chegava a Lisboa. Uma cidade completamente desconhecida. Só a 1 de Agosto chegámos a Trás-os-montes. Uma viagem de três dias nessa conta que deus fez e nunca percebi porquê, mas às duas por três, é mesmo por causa destas e de outras. Há 36 anos, quem saisse de Luanda com destino a Trás-os-Montes só ao terceiro dia chegava. Não ressuscitava, antes pelo contrário chegava mais morto que vivo.
E foi assim a minha morte lenta. Dolorosamente sentida, devagar devagarinho.
Esta noite, dormi mal. A cabeça a funcionar e o coração aos pulos. Como há 36 anos, alguém de meu, viajou a noite toda. E eu viajei no porão, olhando as horas à espera de uma mensagem. Nunca mais me passa. Nunca me passará. Estou muito melhor, o coração habitua-se porque o cérebro, um tirano, dá-lhe ordens e mais ordens, mas sei que nunca me passará. A Pitanga raspou o lençol com a pata. Com o calor que está, como é que esta gata se quer meter debaixo dos lençóis? Frescuras de gata mimada. Sem sono, liguei a televisão. O bando dos quatro, que eu gosto de ver, estava a começar. Uma aventura para os miúdos que já não acham piada aos desenhos animados. Porque será que gosto destes filmes? No meu tempo era só a Marisol e o Joselito. Não admira que a oferta hoje seja atractiva e estimule o que me faltou quando tinha 8, 10 anos. A Pitanga também gosta. Instala-se na minha barriga, olhando encantada para a televisão. Há gatos com sorte.
É sábado. Estou em paz. Está quase tudo nos seus lugares. Não fosse lembrar-me que foram horas e horas de avião a caminho de um destino que me pregou partidas e sustos nas esquinas dessa vida que eu não escolhi e seria um sábado perfeito. Na província. Apetece-me dizer assim na boa sem cuidado algum com a linguagem. Sem pensar que isto não é um diário...Yá! No Ribatejo. Nesta parvalheira.
Não. Não vou para a capital. A minha gente não está. O meu porto de abrigo hoje é um lugar que eu nem sempre gosto. Que repudio muitas vezes. Mas que é o possível dadas as circunstâncias. Não é segunda escolha. É a escolha. O campo. A casa. O mano Zé e a caçula. Afinal, a minha praia. A minha gente.
E agora vou bazar. Parece que não, que estou aqui cheinha de boa vida, mas não é verdade. Programei um dia muito intenso. Se o vou cumprir não sei, nem é importante, mas tenho imensas coisas para fazer. Logo se verá. Digerir o meu tédio, ansiedade e escolha já me dá muito que fazer.
Bom sábado para todos.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

dia difícil de levar

Há dias difíceis. Bota difícil nisso, apetece-me dizer. Se isto aqui fosse um diário, hoje, eu ia dar uma surra nas palavras até exorcisar este dia.
A dificuldade está na nossa cabeça, dirão os sabichões destas coisas, que estão nos livros. Eu que não estudei estas conclusões, também acho. É uma intuição que tenho. Mas ainda assim, o coração deixa-se levar. Afinal, onde anda o meu coração? Bate-bate e torna a bater, por ele, por mim e por tudo o que eu amo, desprezo, anseio, sonho. Bate porque sou e por que não sou. Porque me alegro e porque me choro, e também porque me conformo. Bate rápido, bate lento que até acordo a pensar que vai sair pela boca ou que não está, já, a bater. Palpita, se agita e me prega sustos. Me sorri, mas não hoje.
Acordei na hora marcada. Enganei-me. Era para ser uma hora mais tarde. Quando dei por isso estava sentada no muro do tribunal onde estagiei. Onde trabalhei, muito. Onde jurei por minha honra cumprir com lealdade as funções que me foram confiadas. Onde ouvi presos e mais presos, horas e mais horas, noite fora, madrugada fora, de coração apertadinho. Onde conheci alguns magistrados, que ficaram para sempre no meu coração. Onde vivi a minha gravidez por duas vezes, e onde deixei de fumar dois maços por dia, assim num estalar de dedos num Maio de 1985. Onde o tempo passou por mim e eu nem dei pelo tempo.
A Noémia é que me viu. Ó, olha a Clara!!! E eu levantei-me e fui cumprimentá-la. Devem ter passado uns 12 anos desde que a via ali todos os dias, bebia café ao seu lado no café da frente e falávamos muitas vezes. Ela era da conservatória. Sempre bonita mas mais magra. Muito mais magra. E envelhecida. Perguntou por todos. E voltou a fazer um Óoooooo desta vez escandalosamente surpreendente. Fomos beber café enquanto a minha colega não chegava para irmos então para alcanena. Quando a Noémia chegou junto de mim, estava eu a pensar que não tinha saudades do meu primeiro tribunal. Nem subi. Já não conheço uma grande parte da gente que ali trabalha e os que conheço estão de férias. Mas o edifício, esse fala comigo. Lembra-me coisas. O coração bate-me mais alvoraçado. Estarei eu para sempre presa ao passado ou estas coisas são assim mesmo? As paredes a lembrarem-nos. As escadas a chamarem-nos. O mastro da bandeira, a saudar-nos. A janela do gabinte do juiz, como sempre aberta a recordar-nos destinos, nas diligências fora de horas, fora de pagamentos de horas extraordinárias, dentro do espírito que existia naquele tempo. O cheiro. Os eternos cheiros a dizerem-nos que já ali vivemos parte da vida, que não podemos renegar. É o cheiro do que já passou, a querer misturar-se nas nossas memórias num compartimento que se chama saudade. A Noémia que chegou. E que foi igual à de sempre e que me fez ser a de sempre, mais do que a de sempre. Mais atenta. Mais presente. Mais livre. Menos culpada. Não fosse ali a casa da justiça.
Quando finalmente me despedi da Noémia que estava verdadeiramente contente de me ter visto deste jeito, ( que não vou dizer, porque posso parecer vaidosa ), e que me surpreendeu, porque não ser normal as mulheres serem assim umas para as outras, mas a Noémia sempre foi diferente e não deve saber o que é inveja, fiquei com pena de a ver partir ou de partir eu. Afinal não tinha saudades mas já ali ficava. Afinal aquela foi a minha casa anos a fio, aquelas foram as minhas pessoas, aquele foi o meu tempo. E hoje, há muitos anos também eu parti de outra casa. Aquela que era verdadeirmente minha. Talvez por isso estou mais sensível. Apesar da dificuldade estar na nossa cabeça o meu coração está pequenino e atrofiado.
O dia passou igualzinho ao meu coração. Às seis menos dez já estava pronta para regressar a casa.
O autocarro chegou. Desde que as férias judiciais começaram, somos menos. As minhas boleias estão de férias. O autocarro voltou a ser o meu transporte de manhã e à tarde. A Bélita já lá estava. Apressou-se a desocupar o banco para que me sentasse à sombra. Estava sem paciência para ela. Deus queira que não me diga nada, pensei, a fazer figas na minha cabeça que se fosse com os dedos, cusca como ela é dava por isso e levava a mal. Então a senhora perdeu a camioneta? Não. Vim mais tarde. Ah, eu bem disse a elas. A senhora tem o meu número, se estivesse atrasada telefonava ( como se ela atendesse; já precisei e fiquei apeada ), mas olhe que ainda disse ao motorista para esperar um pouco, veja lá que só saimos às 8,25. E ele foi devagarinho; quando deu a volta à rotunda ainda olhámos mas a senhora não vinha lá.
Valeu-me a chegada do autocarro. O motorista era uma daquelas criaturas que parecem ex-jogadores de futebol, ex-treinadores, claro com a excepção do Mourinho e do professor Queirós, evidentemente. Ex de qualquer coisa. Será que sou eu a alucinar ou este homem perde-se pelo presente como se tivesse ficado lá atrás? Será que só eu dou por isso? A figura de arrumadinho do século passado é tão escandalosa que não estranho, e até me diverte, pois que neste fim de dia, bem preciso de uma distracção. Um relógio amarelo, óculos de sol, emitação barata de uns ray ban, e nem um fiozinho do cabelo fora do lugar. - Vai para onde? Torres Novas. Viu-se nas amarelas para me tirar o bilhete, eu sei que é um embaraço para eles esta forma de adquirir o bilhete, usando o cartão, mas o contrato existe. Lá acertou com o bilhete e até esperou que eu lho entregasse já preenchido. Depois foi um ver se te avias que é uma pressa. A criatura pôs o pé no acelerador e só parava para as passageiras sairem. Surpreendente foi levantar-se a cada paragem para desejar boas férias às passageiras que vinham de Minde, e trabalham numa fábrica de confecção. A uma delas, até deu dois beijinhos, talvez a conhecesse. Cheguei mais cedo mas muito enjoada, dele, das passageiras que falavam pelos cotovelos nas férias que vão gozar, da paisagem, da música que saía do rádio ( estação local que provoca vómitos como os relatos de futebol em carro em andamento ) e confesso que até vinha enjoada de tanto enjoo junto.
Fiquei na garagem. A Pitanga fez-me ir para o centro da cidade à procura de lata de lascas de atum com camarões. Sim porque esta gata não faz a coisa por menos. Embirrou com o pescado com espinafres e mesmo com fome, não come. E dei comigo a discutir manias de gatos, com outro pobre de cristo que se queixava do mesmo que eu e não fosse a capacidade de me rir de mim própria e desataria num pranto, pois que jamais imaginaria que um dia o meu tema de conversa seria gatos, seus apetites e manias. Fui então a caminho de casa debaixo da torreira do sol e carregada que nem uma burra. É mesmo o termo. Uma burra que podia estar tão bem e anda para aqui sem poder com uma gata pelo rabo, estupidamente carregada, que as minhas hérnias um dia destes não gritam, berram e eu que não posso ficar doente não saberei resolver isto, pois quando assim foi até tinham de me vestir, que eu não era capaz de o fazer.
Todo o caminho fui a pensar na minha sina, tão cheia de pena de mim, mas tão cheia, que a minha sorte foi não me ter cruzado com alguém. Malvada terra! Como é que eu não me cruzei com ninguém capaz de ler no meu rosto o desalento, a saturação e a necessidade que tenho de ir embora?
Hoje não é bom dia. Hoje é um dia de partidas. E de chegadas. De viagens.
Mas eu não parto nem chego. Espero. Sentada. Aborrecida. Inconformada. Espero que outro dia chegue. Talvez mais apaziguado
. E que não esteja assinalado como um dia que me tornou uma pessoa menos feliz.

NBC, Bem vindo ao Passado!

saudade de ti

foto retirada do google Não é preciso dizer adeus, para conhecer a dor da minha alma.
Nem ficar a olhar o caminho que deixei para trás.
Nem lenços brancos acenando, nem abraços e beijos finais.
Nem palavras de conforto. Palmadinhas nas costas e piadas de última hora.
Não é preciso dizer adeus para conhecer a dor da minha alma.
Nem partir para me doer a chegada ao desconhecido, temido e culpado.
Não é preciso morrer para me sentir moribunda, longe.
Parti. Há 36 anos. Parti hoje. E deixei lá o meu coração.
Tenho um nó no estômago, uma lágrima dependurada e a alma ferida.
Não há coisa alguma que se chame saudade que doa tanto em mim.

recriando

partida do tempo ( II )

Houve um tempo generoso
semeado, de cristais
nos canteiros de rosas amarelas,
quais lágrimas brancas suspensas,
brilhando,
nas manhãs orvalhadas de cacimbo
E de palavras bordadas a oiro e prata
E de estradas de acácias floridas.
E de futuro, chamando por mim...
Houve um tempo
que eu não sabia o que era o tempo.
Onde é que ele está?
Perdeu-se de mim...
Há dias em que olho o tempo que se foi
Nostálgica
E vejo já o presente, partindo.
Sento-me a chorar,
no porto desabrigado,
Cais do meu desencanto,
Lágrimas negras
Que ele, o tempo,
louco por partir
Não tem tempo de enxugar.
Hoje, queria o meu tempo de volta
Para te sonhar,
e no tempo que é teu,
estar em tempo para te amar.

m.c.s 28.07.2011

Porque sou administradora móvel ( mês de Julho ) de um grupo poético, fiquei sem tempo para escrever, pois tenho que ler todos os escritos ali publicados diariamente e comentá-los, então resolvi recriar estes versos através do post, partida do tempo e publicar no grupo poético. Aqui está, para ficar registado.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Voyage, voyage - Desireless (belas paisagens)

A todos os que gostam de viajar...no sonho!

apenas um campo, duas atitudes

Descansando relaxadamente ao fim da tarde

Regando ao fim da tarde No Bom Amor, ao fim da tarde descansa-se na rede, eu, rega-se as plantas, a minha amiga Manuela. Como se está bem no campo!!!

o tempo partiu

Houve um tempo que me sobrava tempo. E outro, nem tinha tempo para pensar no tempo que tinha. Houve um até que o tempo era só calendário, de enfeitar a parede nas paisagens a mostrar mundo ou a equipa do Benfica, de Bela Gutman, perfiladinha, de encarnado e branco; Coluna, José Augusto, Germano, Costa Pereira, Águas, Torres, Simões. E eu desfolhava cada folha cheia de curiosidade. Era o tempo das amoras, vou dizer ao teu pai que já namoras. E das corridas de bicicleta que alugava no sr. Arlindo, nosso vizinho. A minha era encarnada e a da Fatinha, azul. Para dar sorte. Nesse tempo sobrava para a brincadeira e faltava para a matemática.
Houve um tempo que era tanto o tempo nas tardes longas e perfumadas da inocência que eu crescia ao sabor do tempo de então. Entre berridas e toca e foge. Mamã dá licença, quantos passos. Os de gigante é que eu gostava e os de caranguejos odiava. Odiava o caranguejo, o jogo e o menino que comandava o jogo. Voltar para trás nesse tempo era tempo perdido. Olha a triste viuvinha que anda na roda a chorar, anda a ver se encontra noivo para com ela casar...e vira o disco e toca o mesmo, que a pequenada gostava mesmo era de cantar e rodar na roda. Nesse tempo valia tudo. Ele era nosso amigo. Nos dava as mãos. E corriamos de mãos dadas, tipo irmão, do tempo quente, do tempo frio, do tempo de férias, do tempo de Março, do tempo de praia e do cacimbo, do tempo todo que tínhamos e que na preguiça que ele tinha para se esticar e nos esticar, nos sobrava para nos chatear.
Depois veio o tempo que nos abraçou o sono e nos acordou com o sol beijando-nos o corpo, cheio de truques desse tempo que ia chegar. E mesmo na chuva dançou na rua, e na lua cheia nos contou histórias dos sonhos que nos visitavam. Chegado o cacimbo, chegou a nostalgia de não sabermos o que nos fazia saudade. Nesse tempo ninguém falava inglês muito menos sabia o que era the end. Nem pensar, chegado esse tempo. Ninguém punha termo ao tempo interminável da existência. E quando o capeta no tempo morto de descanso, nos atormentava o sonho cor de rosa e o sono calmo e profundo, gritávamos pela mãe, pelo pai e faziamos figas, cruzes, canhoto, diabo seja surdo, cego, mudo careca e tudo, que éramos eternos, só os maus é que não.
Houve um tempo generoso que semeou cristais nos canteiros de rosas amarelas, como lágrimas suspensas, nas manhãs orvalhadas de cacimbo. E palavras bordadas a oiro e prata. E estradas de acácias floridas. E o futuro chamando...
Houve um tempo que não sabia o que era o tempo.
Onde está esse tempo?
Onde está o de agora?
Perdi-os?
Há dias em que vejo o tempo partindo. Sento-me a chorar, no porto desabrigado, lágrimas que ele, o tempo, doido por partir nem teve tempo de enxugar.
Hoje, queria ter um pouco de tempo para te sonhar, e no tempo que é teu, estar em tempo para te amar.

parabéns Ana Rita

Parabéns linda princesinha!

Votos de um dia muito, muito feliz, nessa cidade Maravilhosa, cheia de encantos mil...
Aproveita tudo.
Kandandu do tamanho do olhar de Deus.
Beijos no teu coração.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

She's Leaving Home- The Beatles

insólito, ou não

O insólito aconteceu.
Já não é a primeira vez. Que o motorista não sabe o percurso. Não estou a inventar nada. Hoje aconteceu algo caricato. Se fosse muito má língua diria que só neste país, mas não, que nos outros acontecem estas e outras também.
Um dia, de Alcanena para Torres Novas, a Bélita ( a marreta do lugar da frente ), assumiu os comandos e num dos seus papéis preferidos, de guia, generala e crítica, indicou todas as paragens ao pobre de cristo que ali caíra sem saber ler nem escrever, nem sequer conhecer o mapa rodoviário, se é que isso existe. A bem da verdade, porque confiamos, acreditámos que era motorista da rodoviária, mas só porque somos boas pessoas. Porque convenhamos, motorista que é motorista não tem de saber antes todas as voltinhas que a sua viatura dá, inclusive as paragens, até ao seu destino? Tem. Mas este não sabia. E por isso na rotunda do Limão Verde, pastelaria da saudosa D. Maria José, mãe da Margarida e do Nuno, onde ia diariamente e onde voltei a ir com alguma frequência, ( tem umas empadas de galinha, fabulosas ) o senhor motorista que me havia estranhado quando lhe mostrei o cartão, num gesto facial assim como que a dizer se fosse da minha terra: Xeeeé, esse cartão aí quer dizer mesmo o quê? olha só a banga!!! Essa chipala não é você, pxxxxxxxt, pópilas, agora tás kota, madiê!, mas como estava a dizer, claro que o sr. motorista não teria a petulância de me observar algo semelhante mas que achou meio esquisito, achou, pois a foto de passe tem à vontadinha 15 anos menos, 15 rugas menos, 15 quilos menos, e quando me vi às voltas à rotunda como se estivesse na feira no poço da morte ( nunca andei ), ou nos aviões ( aí sim ), pensei para com os
meus botões: este gajo é parvo! querem lá ver que o batido me vai azedar o estômago? Pois o senhor motorista achou concerteza que enquanto andava às voltinhas do malhão, ganharia tempo para que alguém, uma Bélita da vida, o orientasse. E claro que a nossa estimada e cusca Bélita imediatamente, à semelhança de outros carnavais passados e os que ainda hão-de passar, porque uma vez assim, para sempre assim, com a voz aguda e irritante, mais uma vez, como da outra, há muito tempo atrás, tomou as rédeas e a partir dali e até sair de torres novas, nunca mais se calou. Ah grande Bélita! Ganhou! Agora percebo porque ocupa o lugar da frente, sempre, faça sol ou faça chuva. O sonho da Bélita será ser motorista da rodoviária. Bem sei que aos fins de semana se senta nesse lugar da frente, no seu papel muito assumido de guia encartada mas não doutorada. " Não tenho o curso mas tomara muitas dôtoras terem a minha competência " A Bélita é guia nas excursões de trazer por casa, como por exemplo, para o Algarve, descida do Douro, ao Minho, a Gibraltar e outros destinos em grupo, e fala do seu trabalho com tanta importância que nos olhares trocados na camioneta, adivinho alguma censura e quem sabe até alguma invejazita dela por não circularem estradas fora, por não se divertirem e não ganharem uns cobres mais, o que é sempre bom para engrossar o ordenado magro que devem ganhar nas fábricas agonizantes que alcanena e arredores ainda têm.
A Bélita não me parece importar-se com o que pensam dela, ela é, o que se pode dizer, mais ela, e cusca e autoritária como é, não me admirava que fosse mais competente como guia, que algumas dôtoras que por aí existem.

que beleza!!!



Os presentes que ainda recebi, do meu aniversário...
Até parecia o Pai Natal a dar-me as prendas.
Quem tem gente assim que nos dá o que não esperamos, tem tudo, quem não tem, pode ter também, mas não é a mesma coisa.
Na mouche!
Obrigada, Lindos!

terça-feira, 26 de julho de 2011

até sempre Amy

Foi hoje a cremação de Amy Winehouse.
Paz à alma da mulher possuía uma voz tão poderosa, única e singular, que será imortalizada através do legado que deixou.

parabéns Susete

Minha kamba Susete, apanhaste-nos. Agora todas nós, o grupo do liceu que caminhou junto durante muitos anos e que nunca mais se perdeu de vista, temos 56 anos. Coméquié amiga? Tá-se bem? Yá. Tasse.
Se estivesse ao pé de ti hoje, juro que ia desencantar um mil folhas ( russo ) para soprares uma vela como fizeste há muitos anos atrás, no outro século, nas Caldas da Rainha, num gelado Vianneta, enquanto eu, a minha família, a kamba Milú, a Mimi e outros amigos te cantávamos os parabéns.
Xeeeeeé! Estou com saudades tuas, kamba.
Tem um dia muito feliz, junto da tua família linda, alegre e extensa.
Beijos no coração.

parabéns kambas do meu coração

Meus kambas
Neste dia de Sant'Ana quero felicitar-vos por mais um ano de aniversário de um casamento tão feliz.
Vocês são a certeza de que vale a pena investir numa relação a dois, pois não são só sobreviventes . São uns vencedores.
Desejo-vos o maior sucesso, sempre, no vosso projecto de amor, tolerância, respeito, amizade, paixão, cumplicidade e muito humor. Beijos no coração.

recuando às raízes de mim

Não sou avó. Dirão alguns que já vão sendo horas. Não penso nisso. E não sou o relógio das crias. Nem sei se terão esse apelo pela descendência. Para já. Se me perguntarem se queria ser avó, queria sim, queria muito. Nunca penso nisso. Mas hoje, dia dos avós, fico em êxtase perante a idéia de uma, duas criaturinhas, ou mais, muitas mais ( duvido ) entrando na minha vida. A precisarem de mim. A contar-lhes estórias da minha terra, das suas terras, das terras dos seus pais. A levá-los à escola. A fazer-lhes bolos e papas, tapioca, flocos e nestum. A levá-los ao cinema, ao teatro e aos espetáculos de dança. A ensiná-los a ler e a escrever. A desenhar. Levá-los a Luanda para sentirem o cheiro da terra, do mar e do amor. A aprender com eles...a ser avó. Fico em êxtase sim.
Tive avós. O avô Francisco, a avó Clara, a avó Rosalina das Dores e o avô Carvalho. Conheci-os todos. Não é verdade? É sim. O sô Santos se encarregou de falar tanto do pai dele que eu sabia que era mais baixo que a avó Clara,( esta, era alta ) que era duro que nem as rochas de Trás-os-Montes, que trabalhava de sol a sol, que foi caseiro de uma quinta no Sendim da Serra e que a avó Clara, os filhos e quem vivia ali na Gouveia e arredores que eram muitas léguas para lá do rio Sabor, até à raia de Espanha onde ia negociar gado, a cavalo em cavalos ou em burros, mulas ou machos, lhe tinha um respeito e admiração profundas. Porque era muito sério. Homem de palavra. E amigo do seu amigo e da família então, nem se fala. Conheci sim, o avô Francisco, que nem sei se algum dia chegou a descer até ao Porto. Talvez, porque sempre ouvi dizer que era um visionário. No dia que chegou a carta a Luanda, aquele envelope com uma fita preta a denunciar o luto da família, deitado na sua cama, agarrando na missiva que a avó mandara escrever a alguma neta, talvez à Leonor, que pela sua esperteza já se advinhava que ia ser professora primária, sô Santos chorou, soluçou, quieto no seu sofrimento mas não disse uma palavra. A mãe é que se apressou a dizer perante a minha estupefacção, que o avô tinha morrido. Eu tinha talvez 8 anos. Depois as camisas brancas do pai passaram a ter uma barra preta numa manga, não sei qual, a que se chamava, fumo. Se eu conheci o avô Francisco? O que é que acham? Conheci sim.
E a avó Rosalina das Dores? Quando a minha mãe entrou na loja do meu pai, seu vizinho, ali na avenida brasil, à época, rua do saber andar, e este com aquele jeito malandrão, bonitão, de olhos doces e sorriso branco e lindo se meteu com ela, a minha mãe agarrou numa batata da caixa, e atirou-lha acima. E a avó Rosalina praguejou. Mas praguejou feio para proteger a sua filha ainda menina de 16, 17 anos. Era uma mulher alta e magra. Vestia de escuro e usava o cabelo apanhado numa banana, muito na modao. Uma verdadeira senhora. Habituada que estava a viver e conviver com a sua madrinha, senhora de sangue azul, que vivia num palacete com brazão, na aldeia de Vilar lá para a serra do Caramulo, ela que era de canas de senhorim. O sô Santos logo nessa primeira abordagem escreveu nos céus, fazendo futurologia que ainda havia de ser seu genro, o que enfureceu até à medula a avó Rosalina e divertiu a mãe, que não passava de uma menina franzina, envergonhada e linda. A avó adoeceu depois. E sofreu muito. Um cancro na cabeça atirou-a para o hospital e morreu antes de vir a ser sogra do sô Santos. Conheço a avó Rosalina do pai falar dela com muito carinho e dor. Conheço a avó da mãe falar dela sempre de lágrima no olho. Do avô me levar ao cemitério todos os domingos e ver a sua fotografia na campa. De me achar parecida com ela. Até hoje. Conheço a avó e quando vou a Luanda vou visitá-la ao cemitério da estrada de catete, ao cemitério de sant'ana, nome da santa que por acaso hoje dia dos avós também é o dia dela ( da santa ). E sinto uma paz santa a cada vez que ali vou. Depois de 33 anos voltei ao lugar onde ela tem a última morada física, sem que alguém me orientasse. No dia 10 de Setembro. Um dia especial para mim. Por outros motivos e também este. Conheço a avó Rosalina? É claro que conheço.
E a avó Clara? Ouvi sempre falar dela. Uma espécie de rainha. Uma matriarca. Uma mulher alta, elegante, cabelos pretos num carrapito, olhos pequeninos cinzentos, nariz bonito, lábios finos e tez branquíssima. Trabalhava no campo e em casa. Na sua horta, que se chamava a horta das Fontainhas. Foi caseira da quinta juntamente com o avô Francisco. Teve 1o filhos. Dois deles morreram pequeninos e eram gémeos. Era a cozinheira de serviço nas festas da aldeia e era tratada por senhora Clara com a deferência de não lhe chegarem perto porque era uma mulher de forte personalidade, directa, altiva e decidida. Se a provocassem nunca mais se meteriam com ela. Era um mulher com pêlo na venta. Tinha filhos preferidos. Admirava muito o pai e a tia Margarida e contava muito com eles. Protegia o tio Fernando como uma galinha o faz. O tio Zé era o primeiro e por isso havia ali um afecto especial. O tio zé manel, acácio, celeste e augusto estavam ao mesmo nível no afecto. Eram todos filhos e ela gostava de os ter debaixo da sua asa. Tinha algumas amigas na aldeia. E uma em Lisboa onde ia de vez em quando. Um dia disseram-me que a avó ia para Luanda uma temporada. Adorei a idéia. E foi. E foi difícil. O meu temperamento e o dela chocaram-se. Diziam que éramos parecidas. Adoeceu e foi mais difícil. A caçula era bebé e adorava-a e eu adorava a caçula. A relação dela com a minha mãe foi muito boa e o meu pai andava feliz. Os tios também e eu habituei-me a dividir. Consegui que usasse um vestido azul escuro e pusesse de lado o preto e que tirasse as meias opacas. Consegui que ela se risse à gargalhada e hoje gostava que ela aqui estivesse para lhe sentir o colo. Quando eu tinha 15 anos voltou para Portugal porque tinha cá os seus outros filhos. Que eram apenas 3. A Margarida, a Celeste e o Zé. Os restantes estavam em Luanda e apenas o Zé Manel estava em Moçambique. No dia em que a fomos pôr ao Príncipe Perfeito, barco que a trouxe para Lisboa, a caçula chorou sofridamente ao colo dela e depois ao meu colo enquanto lhe diziamos adeus, já ela estava no barco acenando com o tradicional lenço branco. E eu chorei com a caçula. Vivi na sua casa, um mês em 1975, na aldeia de gouveia, em trás-os-montes. Esteve em torres novas na nossa casa aind auma vez. Estive com ela depois em 77, 78, porque fui visitá-la e foi a última vez que a vi. Foi uma grande mulher a minha avó Clara da Assunção.
O avô Carvalho...o avó Carvalho é o avô de todos os avós. Os outros que me perdoem. O avô carvalho é o avô que tenho como exemplo. Como eu gostaria de ser para os netos que possa vir a ter. Ele foi muitos. Ele foi tudo. Com ele não tinha falta de ninguém. Nem de mãe nem de pai. O avô Carvalho mora em todas as memórias da minha infância. Em todos os sábados. Em todos os momentos felizes e noutros menos felizes, também. Mora desde que me lembro de existir. No pão espanhol de sábado à tarde. Na manhã de domingo, na Chicala. E nos correios da Baixa. No cemitério regando as flores com o regador cinzento. No clube de caçadores. Nas ida às salinas, a caminho da barra do Kuanza. Nas manhãs que o ia chamar a casa gritando, até ficar rouca, o seu nome, antes que aparecessem os sipaios a quem eu temia. No balão de hélio comprado na feira popular onde íamos. Nas noites sentados no patim da " cubata " olhando a rua e as pessoas que passavam e emitando o jornaleiro " olhó diário " e ele dizia, diz: Olhó diabo, e eu repetia, olhó diaaaaabo. Na carrinha azul que rolava por Luanda fora. No dia de natal que fomos levar o almoço ao tio Augusto, que estava de serviço na fortaleza de São Pedro da Barra e vi pela primeira vez, homens negros, mortos, pelas bermas da estrada, estávamos em 1961 e começara o " terrorismo ". Na nota de 500 escudos para uns sapatos a estrear no meu aniversário. No rádio a pilhas vindo de Porto Alexandre. Na fotografia em cima da ponte do Locala. De outra, de capacete numa fábrica de peixe em Moçâmedes. Numa folha de welwisthia que levada do deserto para que eu a conhecesse, essa planta única, do deserto do Namibe que ele contava que atravessava num mini-jipe. No colo, quando o mano Zé nasceu. Nas cartas que me escrevia. Nos natais. Na atitude aparentemente fria ( a minha família é assim ) quando chegava e na mágoa com que ficava quando se despedia. Nos dias alegres e brincalhões, muito conversados e historiados desde que chegava até que partia. No internamento na casa de saúde de Luanda e no casaco que eu e o pai lhe fomos comprar porque não trouxera agasalho nenhum de Moçâmedes. Naquela vez que tememos que tivesse morrido por lermos no jornal o seu nome, sem fotografia, na página das participações de defuntos o que obrigou o pai a ir à mortuária que ficava a seguir ao hospital maria pia, para reconhecer o cadáver e a ansiedade que foi esperar pelo pai. A carta dizendo que não sairia de Porto Alexandre, apesar da independência do país estar a chegar. Depois outra a dizer que estava em Moçâmedes. E outra a dizer que estava no Algarve e que fizera a viagem mais louca da sua vida, numa traineira, de Moçâmedes para a África do Sul e daí para o Algarve. Depois, em Lisboa. E depois ainda em Vilar. E em Torres Novas, quando casei. E por fim em Tondela. E tenho muita dificuldade em falar do fim. E não quero.
O meu avô foi um herói. O meu herói. Homem bonito. A minha família tem gente bonita. Alto. Nariz fino e direito. Olhos malandrecos e sorridentes. Mãos bonitas e voz bonita. Sotaque do sul de Angola. Conhecia os dialetos quase todos. Até aquele dos estalinhos. Sem vícios. Não sabia fumar e quando o fazia não travava o fumo e parecia um sapo engasgando-se. Bebia cerveja preta e gostava de comer. Tinha um humor refinado, ao estilo inglês. Inteligente, perspicaz e corajoso. Era um autodidata que surpreendia e encantava com o seu saber acerca de tudo o que é importante saber e não só. Era imensamente respeitado e por alguns, até temido. Na avenida brasil e no largo camilo pessanha todos o admiravam. Tenho encontrado amigos de infância mais velhos que eu, que recordam o Sr. Carvalho com saudade e traçam pormenores da sua personlidade que os marcaram. Ele mora nas memórias de muita gente e isso enternece o meu coração.
Hoje é dia dos avós. E eu que não sou avó, mas tenho o nome das duas, sei o que é ter os melhores avós do mundo.
S
into que as minhas raízes são sãs e fortes e acredito que eles fizeram com que eu possa vir a ser a melhor avó do mundo.

Há coisas que nunca mudam

Terça-feira, dia de mercado semanal. Caminho apressadamente para o autocarro. Há coisas que nunca mudam. Nem mesmo as férias me alteram a sina. A minha pressa contrasta com a calmaria da cidade, que partiu para férias. O Agosto aproxima-se a passos gigantes e há terras que tal como a minha pressa, não surpreendem.
Sou do tempo que a vila, sim, porque era uma vila, os seus habitantes da periferia ou mesmo das aldeias, em dia de mercado como hoje, diziam, vou à vila, e os teimosos ainda hoje o dizem, mas dizia eu que a vila morria num êxodo histérico, a caminho da Nazaré. Para banhos. Os banhos dos rapazes dos 18 aos 30 eram outros. Sobretudo aqueles acabadinhos de chegar do ultramar. Iam à cata de francesas e suecas, não acredito que estou a escrever isto, mas se era verdade?!!!Quanto mais altas, melhor. E mais loiras. E mais lindas. E mais livres e mais prontas para viverem a vidinha, despacharem-se que era uma pressa...
E éramos nós a perguntarmos o que é que as suecas e as francesas tinham que a gente não tinha. E eram charros, a liamba que vinha das áfricas escondida nas malas, e era o álcool, as cervejas que se habituaram a beber no mato, na torreira do sol, e era o ócio, pois ainda não tinham nem queriam ter emprego, e era o sangue novo na guelra e o pânico de não " aproveitarem " a vida, porque esta ainda há pouco, valera um tostão furado no cano da metralhadora que empunharam e viram empunhar, pelo menos por dois longos e loucos anos.
E como tudo o que é bom acaba rápido, e o que não é também, que esta vida corre e corre connosco dos lugares onde fugimos de nós, eles, estes " borrachos " do tempo em que a cidade era uma pacata e alegre vila, voltavam ao pombal anilhados na dependência que tinham com as famílias, os amigos e alguma namorada. E era vê-los exibindo um umbigo do tamanho da terra, tirada que fora, a barriga de misérias. Se havia alguma ilusão de os vermos mais bonitos, o ar da praia, os benefícios do sol, que empresta cor à pele, e o descanso, desenganávamo-nos, assim que lhes púnhamos a vista em cima, pois estes rapazolas charmosos ( eram quase todos meus amigos, rssssss, como é que pode?! Pode ) que iriam ser os kotas empestados de charme, hoje, apareciam com a palidez com que partiam, olheiras até à boca, o corpo cheio de boa vida e a pretenção de conquistarem as moçoilas da terra que os aguardavam tolas e esperançosas, repetindo frases que não ousavam tornar-se audíveis, agora é que é, ele vai reparar em mim, as suecas e as francesas já lá vão, tenho um ano, um ano inteiro para mostrar o que valho.
Enquanto isso eles passeavam-se pela avenida junto ao rio, saltitavam da Abidis para a Império, pastelarias do jet-set, apareciam nas piscinas municipais, não para mostrarem o físico mas antes para catrapiscarem as morenas que mergulhavam e nadavam dengosas na água doce do gigante tanque aquecido e coberto, ou no outro ao ar livre, que fartos de loiras vinham eles. Uma amiga era como um homem, para estes conquistadores de meia tigela e por isso ouvia-lhes os disparates, estava a par das asneiras, sabia quando atacariam de novo, porque os homens deste tempo e com esta personalidade precisam de manter a amizade das criaturas que lhes dão tampas. Aliás estes homens, que ainda não tinham crescido e carregavam fardos pesados duma guerra inglória e já tinham conhecido o sofrimento, ainda eram uns meninos. Os carros topo de gama que os pais, abastados agricultores, comerciantes, empresários, lhes punham nas mãos como que em jeito de prémio por terem sido uns heróis e voltado pelos seus próprios pés, eram um brinquedo que usavam e abusavam e servia de isco para o engate. Às vezes, cruzo-me com alguns, desse tempo inconsequente,que até tinham uma voz bonita, um corpo perfeito, o cabelo comprido, mãos macias e calçavam irrepreensivelmente. Estão iguais?! Aparentemente. Até me esqueço que deveriam ser uns kotas charmosos. Envelhecidos 30 e tal anos. Cansados. Doentes alguns e outros já nem me cruzarei nunca mais com eles. Mas já não passeiam francesas nem suecas. Hoje vagabundeiam sozinhos. Carregando o desencanto, a tacanhez da cidade, e os quilos que engordaram( todos nós, eles também não escaparam ). E quando assim é, sinto-me também desencantada porque morreu uma energia qualquer, forte, entre mim e estas pessoas que o tempo conformou.
Mas dizia eu, lá muito no começo deste texto, que a cidade é uma pasmaceira, mesmo em dia de mercado. Pois é. Nem o pregão desesperado da cigana que vive na ladeira do ex-hospital militar move a conformação que baixou a esta terra bonita, porém triste, do ribatejo. " Directamente da Zara, mulheres, são só 5 aéreos... comprem, que está em saldos, mulhéeeeeeres. É aproveitar que é dado ". Ninguém se entusiasma. Não há entusiasmo. Eu vi em Peniche. Os restaurantes vazios. As ruas tristemente vazias. A praia vazia. Os bolsos vazios.
Até o autocarro, a caminho da terra do rapazinho que ganhou o prémio das olimpíadas de matemática, vai vazio também. As marretas no primeiro banco, a senhora que está sozinha porque o marido está na Escócia, o rapaz que desce na Videla, a rapariga ucraniana que se desfaz em mesuras comigo, e eu. Soube que já tinham dado pela minha falta, até pediram ao motorista que esperasse, na 2ª feira. Inutilmente, pois vim directamente de Lisboa, disse à Bélita, pois que a quis informada das últimas novidades. Eu sei que ela adora saber coisas. Quadrilheira que eu sei lá, fica feliz quando sabe qualquer coisita de mim. E eu abro o jogo. Muito calculado, evidentemente. Só para lhe poder ver o rosto de felicidade e cumplicidade (?). É assim uma espécie de ficar por conta das delicadezas que tem comigo. Não me custa nada e faço uma criatura feliz.O motorista que não é o sr. margarido, olha o meu cartão. Digo, para Alcanena. Digita o código e entrega-me o bilhete. Empresta-me a esferográfica. É motorista do TUT e aposto que ficou confuso. As minhas companheiras de viagem que saem na minha paragem estão de férias, se não fico à coca, vou parar à garagem e deixo o tribunal para trás. Por falar em tribunal, até nem me custou voltar ao emprego, trabalho, exercício da profissão, como queiram e achem melhor chamar. Estou por tudo, neste particular. E noutros, também. Que seja como quiserem, a ver se eu me ralo... Apesar de não estar para aqui virada, ( para o trabalho ) pior, pior é ser uma ilha, deserta. E é como me sinto. Uma ilha que não avista outras ilhotas mais pequeninas mas que lhe pertencem. Isso é que custa, mas o que é que eu quero?! É a minha sina. Na cidade pacata onde vivo, em Lisboa, ou noutro sítio qualquer, o meu destino é este. E não posso nem quero mexer no destino. Como uma colega diz, tenho que me aguentar à bronca até daqui a uns dias, até Setembro e depois voltar a respirar plenamente no ritmo certo para não ter taquicardia.
Há coisas que nunca mudam...

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Amor Electro - Bem Vindo ao Passado

não lhe chego...

Penso na vida. Em mim. Na crónica que acabei de ler. Ficou-me uma frase que o escritor não inventou. Somente usou. " Não lhe chego aos calcanhares ". Procuro alguém, para usar a frase batida. E encontro de imediato.Esteve comigo no fim de semana. Não lhe chego aos calcanhares. E não me importo. Não sou pessoa de me comparar. Nem para o bem nem para o mal. Não vivo a vida de ninguém, não queria estar no lugar de ninguém. Acarreta outras responsabilidades que não quero ter. Não invejo ninguém. Não dá jeito. É um desconforto, uma chatice, perda de energia.

Falei com ela sobre isso. Também não é invejosa. Se calhar está nos genes.

Mas, olhando a sua vida, não lhe queria estar na pele. Nunca serei uma heroína, e ...não lhe chego aos calcanhares.

respirar...fundo!

Boa Viagem, boa estadia, bom trabalho e boas férias.

Auf wiedersehen e hasta la vista.

Amo-vos.

domingo, 24 de julho de 2011

episódio

foto tukayana.blogspot" Vê lá se aproveitas. Olhos bem abertos para os gajos bons " disseram-me ao telefone. Uma brincalhona, é claro. - Aonde é que eles estão? Aonde?, foi a saída mais rápida que encontrei para o conselho. Como este, há sempre muitos por parte das meninas amigas, que gostam de brincar. As mulheres falam mais de gajas que de gajos, mas também calha de quando em quando. Depois de desligar, fiquei a olhar a água azul e fria da piscina e o deserto de gajos bons e maus que por ali havia. Fiquei com o sorriso suspenso, como se o frio da água me tivesse congelado o gesto e se acaso aparecesse um dos bons, fugiria dali a sete pés, qual centopeia, e já não seria bom, pois eram pés a mais e susto também.
Mas, afinal, o que é um " gajo bom "? Perguntem-me, vá, vá, que eu respondo. Não que eu tenha a fórmula, mas se quem me aconselha a arregalar os olhos soubesse o que eu acho dos gajos bons desta vida, ficaria desiludida comigo. Quer dizer, eu acho que desconfia mas não acredita que um gajo bom precisa de ter uma voz bonita. Com sotaque? Só se fôr o sotaque da banda, levezinho, não vamos exagerar né? Pele morena. Mãos perfeitas. Bem humorado. Respirando inteligência. Ah, e bem calçado. Nada de t-shirts de decote redondo junto ao pescoço, nem fios, pulseiras e anéis de ouro. Bigode, nem pensar. Barba pode ser, mas bigode sozinho a esconder as feições, senhores, é coisa do século passado e mesmo que a moda pegue de novo, acho que as mulheres não gostam. Mas será este o padrão? Eu oiço-as, mais do que me oiço a mim, e sei que um gajo bom deve ter mais de 1,80, deve ser bonito, grisalho, com alguma boa-vontade integram os carecas neste rol, olhar de el matador, o que não é difícil porque as criaturas que pertencem à década de 40 e cinquenta, (( quase todos ) são muito cheias de si, e bem vestidos e cheirosos. Há quem acrescente, olhos verdes. Eu diria, e o rabinho lavado com água de colónia, não???
Enfim! Estava eu a olhar para a piscina deserta de apolos e outros deuses, quando de repente surge um que poderia corresponder à minha descrição e à descrição das mulheres no geral. Este " gajo " bom, chegou à espreguiçadeira e poisou a toalha. Tirou o boné ( não sei bem se ganha ou perde qualidades ), descalçou os chinelose e não despiu mais nada porque ficaria como veio ao mundo. Encaminhou-se para o chuveiro. Parou, abriu a torneira, levantou a cabeça e bateu com os olhos nos meus que sorriam imaginando a minha amiga... e se imagino mais gozo me dá pois aqui está alguém com os requisitos necessários para ficar no rol dos gajos bons. É claro que não lhe ouvi a voz, não lhe vi as mãos, não me parecia bem humorado, nem estava bem calçado, quanto à inteligência...enfim, deixou muito a desejar quando se convenceu que era um verdadeiro dono do pedaço. Mas, tinha mais de 1,80, era moreno, grisalho, elegante; não lhe vi a cor dos olhos mas era indiferente com todos os outros itens. O deus apolo pôs um pezinho na água, na beirinha da piscina, e sem que eu afastasse os olhos da figura e ele farto de saber que estava a ser olhado, dá um mergulho daqueles, que para quem nunca mergulhou na vida ( eu ) só consegue achar maravilhoso e só não há palmas porque aquele não era o meu gajo bom, mas o gajo bom da minha amiga e eu apenas observava como se comporta um gajo bom das gajas com mais de 40. Com mais de quê? Das gajas de todas as idades, e mais aquelas que assim que começam a usar sutien, já estão a investir nos kotas, pois que estes espécimes gostam mesmo é de catorzinhas, brancas ou negras, a cheirarem a cueiros, a boca cheia de balões da pastilha elástica e piruetas no trapézio.
Com estava a dizer, o apolo universal inicia a sua exibição. A plateia é fraca. Eu e um casal de duas mulheres, uma negra e outra branca, que são namoradas pois já as vi aos beijos dentro de água e são muito queridas uma com a outra quando estão ao sol nas espreguiçadeiras. Há também um espanhol que tem uma perinha, uma barriga enjoativa e usa calções pelos joelhos, às flores, e se passeia pela piscina dos putos como se fosse vigilante. O Apolo dá umas braçadas até ao meio da piscina, e olha para mim, quietinha no meu canto, apenas alimentando a vaidade do gajo bom das minhas amigas mulheres, só por estar ali a olhar para a figura. Depressa chega ao topo. Volta para trás e faz outra piscina. Desisti. Já vira tudo o que havia para ver. Agarrei no livro de crónicas de Lobo Antunes. Isso sim um livro escrito por um...não, apesar de ter uma voz bonita, ser inteligente, ter sentido de humor, não sei se tem mãos perfeitas e se anda bem calçado, por isso fico-me por um escritor bom, para lá de bom, apenas e só, um dos meus escritores preferidos. Hei-de debruçar-me sobre este tema para perceber se os meus escritores preferidos são gajos bons. Desconfio que sei qual vai ser o resultado. Mas será um estudo para depois de férias. Voltando ao apolo versão kota, voltei a ele quando alguém deu uma gargalhada. Olhei à volta. De gajo bom nem vê-lo.
Conclusão a que cheguei, recordando outra amiga que me diz que já não há gajos bons. São todos de plástico. Ou irreais. Ou uma ilusão. Será? Ia jurar que vi alguém que era um gajo, se era bom, não o sei. Também sei que apanhei sol na moleirinha. A confusão que a minha amiga havia de me arranjar...

Valerie by lookalike (R.I.P. Amy Winehouse)

Uma Força da Natureza a quem a natureza não deu força.

sábado, 23 de julho de 2011

Amor Electro - A Máquina

o mar eleito

foto tukayana.blogspot

nem sempre significa tempestade

foto tukayana.blogspot

um pombal ecológico

estar em casa ao 2º dia

foto tukayana.blogspotGiro, giro, e vou dar sempre ao mesmo lugar. Às palmeiras e à terra. No presente dum passado recente, que tem uma vida de duas décadas e mais uns anos. Estas árvores rainhas abraçam-me os sonhos. Conhecem-me como os homens conhecem as redes que cosem na praia. Bordo bilros e vejo partir as traineiras, pesco estrelas do mar e falo com os cavalos marinhos, suspiro por um sorvete e agasalho-me num xaile branco enquanto a noite percorre a península pacata e rude.
As ruas, os becos, as pedras, os bancos e as muralhas respiram profundamente esse tempo que já vivi. Suspiram como que a dizerem que vão-se os maus tempos, venha a bonança. Feitas pazes aqui me reencontro no fundo de mim e me reconheço pessoa que se faz contente a cada minuto, hora e tempo de descanso, num somatório de dias que em breve terminarão. Como este prazer de nada que fazer e também o de parar o tempo e atirar fora o relógio, calçar os chinelos, vestir vestidos de malha, dos saldos de outros verões, andar de rabo de cavalo, óculos de sol, cara limpa de maquilhagem e tudo o mais que me escraviza longe daqui.
Ontem, hoje e amanhã o calendário não tem tempo. É precioso este intervalo que vou gozar com a alegria de escolher aqui ter voltado neste final de férias. Eu tinha que regressar ao mar mais lindo deste país para me reflectir na sua beleza e iniciar a semana com a certeza de que nada me faltou nestes dias que escolhi para ser feliz.
Voltar, é uma viagem que não tem princípio nem fim. É um estado de alma que guardo numa caixinha de música e que de vez em quando, preciso de abrir, para que se soltem acordes que me harmonizam e me fazem sorrir patetamente.
Estou rodeada de terra, de mar e de afecto. Como uma ilha de sonho. A todo o resto, sou praticamente indiferente.
No intervalo, sei notícias do mundo, de quem está de férias noutro mar igualmente lindo e isso, e isto, me provocam uma paz santa, neste dia quente.
Bom sábado para todos.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

uma viagem no 36




Qual o transporte que prefiro, para me deslocar em Lisboa? Metro, eléctrico ou autocarro? Sim porque não vou falar em motas. Acho que não conheço ninguém em Lisboa que tenha uma mota. Ah, por acaso conheço, mas vive na zona saloia e não dá muito jeito ir a Lisboa de propósito só para me transportar. E também não quero falar de automóveis de amigos. Uns estão a trabalhar e têm o carro parado à porta ou na estação de metro de Odivelas ou do Senhor Roubado, outros estão em Luanda, outros em S. Paulo, no Dubai ou em Madrid. Porque isto de ser angolana e ser amiga para sempre de algumas pessoas que não vivem em Portugal e que se movimentam pelo mundo nos aviões, ou simplesmente estão a dar apoio a familiares numa qualquer cidade da Europa que não Lisboa, tem os seus contras e uma criatura, de repente, está de férias em Lisboa, dá-lhe qualquer coisinha que tem que ir para o hospital e lá tem de chamar o 112 porque apesar de serem muito amigos dela, não estão e não se pode estar a incomodar os vizinhos que nem sabem o nosso nome. A Marta, da loja sabe, e levava-me a contra-gosto ( pelo motivo ) até ao hospital mais próximo, ou a Mónica, a cabeleireira, ah, ou o senhor do talho, e a senhora da churrasqueira. Já os donos da papelaria, esses eram capazes de atravessar a rua para me levarem à farmácia que fica ao dobrar da esquina. Ele é antipático!!!! E apesar dos esforços da mulher, uma loira bonita, sempre com o cabelo arranjado, decotes grandes, lábios muito pintados de rosa forte e unhas de gel, apesar da simpatia dela, ele com o seu mau humor e desapego pelos clientes e vizinhos, não a deixaria tomar uma atitude mais próxima que se traduziria em vários quilómetros até ao santa maria, por exemplo. Mas ninguém aqui está para ter um piripoque.
Afinal, que meio de locomoção prefiro para me deslocar em Lisboa? Sem dúvida, que é o autocarro. Isto salvaguardando a idéia de que só assim é, porque não trabalho na capital.
O 36 é o meu fiel amigo. Deixa-me perto de casa. A frequência é a possível. Nunca vi ninguém ser roubado. Viajam muitos velhotes, que descem no Lumiar e na Quinta das Conchas. E até já conheço alguns passageiros assíduos. São alguns anos a andar no 36.
Entro no 36. À cabeça, um euro e cinquenta. Quando voltar em fim de semana já será mais. quinze por cento mais. Eles, que nem carrascos do povo deixaram a notícia para os jornalistas no-la transmitirem. Não tenho passe. Só compensa ter o do metro. Claro que compensa porque circulo ao fim de semana. Olho à volta e páro num lugar da frente. Daqueles para os deficientes. Não sou e agradeço muito ao Criador, mas sento-me. À minha frente senta-se uma velhota de bengala. Sorri-me e eu sorrio-lhe. Do outro lado os lugares estão ocupados. Tiro o pacote de sumo de goji e a barra de cereais e gengibre acabadinhas de comprar no Celeiro, por falar nisso já tenho 90 pontos mas ainda estou longe dos 20o que me darão um bónus de alguns euros que eu acho fantástico e que me anima a comprar naquela loja. Apeteceu-me perguntar à velhota se era servida. Mas para quê? Ela ia dizer que não e verdade seja dita, não entregaria a palhinha do meu sumo para que bebesse do meu sumo e mo restituísse. Se ela quisesse, dar-lhe-ia o sumo de vez, mas não me apetecia muito ficar sem a minha bebida. Já a barra poderia parti-la ao meio, mas aposto que ela não gostaria do piquinho a gengibre. Tem cara de quem não gosta de picante. Mas que olha, olha, e isso incomoda-me. Já não tem idade para augar...
No Marquês, entra um homem enorme, possante mesmo. De óculos escuros e uma daquelas coisas que parece uma bengala mas não é e não sei como se chama. Que estica e encolhe. Para cegos. Conheço-o destas andanças. Senta-se de costas para o motorista, numa vaga que se deu na avenida da Liberdade. Acabei o meu lanche. A barra fez-me sede e não tinha água. Imaginei-me num tanque cheio dela. Fresquinha. Por vezes digo às pessoas o que as surpreende, se calhar pensam que sou avariada, que há dias de calor que se me apanhasse numa tanque cheinho de coca-cola era uma mulher feliz. Nunca atento no doce da mesma e aquele açúcar a colar-se à pele, rsrsrsrsrs, apenas penso nos piquinhos que a coca-cola faz na boca, no céu da boca, o prazer de sentir o gás, hei-de pagá-las todas e depois não tenho quem me leve de automóvel e lá terei de ir de ambulância apitando num tinoni angustiante, que eu já sei o que isso é de acompanhante que fui de uma criatura a quem lhe deu um fanico, daqueles que são mais as vozes que as nozes, mas preocupante, pois o que se fala mais por aí é em AVCs e a pobre de cristo não sentia o braço, nem a cara, que até a mim convenceu que já tinha a boca à banda. E a cor? Verde, não de raiva mas de susto. E lá fui eu dentro daquela coisa a apitar, a apitar, num desesperado e desnecessário apelo à compaixão pois que a A23 pouco movimento tinha e não se justificava tal aparato.
O autocarro voltou a parar. Em frente à praça de touros do Campo Pequeno. E entraram duas pessoas. Casal. Homem e mulher. Cegos. Há muito tempo que a não via. Por ser mulher mexe mais comigo. Conheço esta realidade. Da mulher cega. Nunca a vejo que não me lembre disso. Nascer cego não sei como é. E ficar cego também não, obviamente. Mas assistir ao processo da ceguez, sei. É mau. E caricato. Sim. Caricato. Hão-de estar a dizer: A mulher é parva ou quê?
Vê-se bem que não sabe o que isso é. Pois...sei. E doi muito estar junto de alguém que amamos e que começa a perder faculdades. Neste caso, a visão. E não é mais uma graduação nos óculos, menos uma lentezita, que atrapalha e não nos é esteticamente favorável. É cumprimentar alguém que casou e dar os pêsames porque não vê bem e confunde com aquele que perdeu o pai. Se a minha amiga Milú estivesse por perto na hora, diria: Ahahahah, a D. Celeste Ganhou!!
C
aricato não é? Afinal tenho razão.
O casal de cegos esperou que dois indivíduos perfeitamente normais se levantassem, o que fizeram sem pressas. Apressei-me eu a levantar-me, mas não foi preciso chamá-los porque se acomodaram nos dois lugares então desocupados.
Há perguntas que nunca farei. Há perguntas que nunca fiz à minha mãe. Porque me angustiava e porque preferi não saber, qual avestruz mergulhada na areia movediça que é a da cobardia, para aceitar. Hoje faria todas as perguntas que achasse necessárias para lhe aliviar a dor e o pesadelo que deve ser viver nas trevas. Sempre que vejo esta mulher cega que entra no campo pequeno e sai no lumiar apetece-me dizer-lhe que é uma mulher de coragem. Fico quieta no canto escuro a que me remeto, perante a luz que ela irradia. Avisou o homem que vinha com ela que era chegada a paragem e sairam. Ela tem aquilo tudo calculado e não falha. Sai sempre na mesma paragem. O outro, aquele que vai para Odivelas, mantinha-se quieto e calado. Lá atrás umas mulheres comentavam: Vejam bem, vejam vejam,( que ironia cruel ) que não se queriam levantar para dar lugar aos cegos. Sentadinhos no lugar deles, que lata, o sr. motorista devia pô-los na ordem.
Não soube se era comigo também. Não me interessava saber. Aliás já não me interessou mais nada. As lembranças umas vezes fazem bem outras não. As minhas lembranças hoje sentaram-se nos lugares do autocarro para invisuais e outras deficiências. Sentaram-se nas consciências e inconsciências de todos os passageiros do 36, que me transportou e viajaram comigo até casa.
E na minha consciência? Foram só as lembranças que se sentaram?

quinta-feira, 21 de julho de 2011

aconteceu em lisboa

foto tukayana.blog.spotAi que sede! Ai que sede...
A temperatura não é exageradamente alta, mas, até no buço, na nuca, por baixo do relógio, o suor nasce, querendo dizer que estamos a mudar para os trópicos e ninguém nos avisou, e não tarda nada, ver-nos-emos em plena áfrica; só faltarão as árvores das patacas para uns quantos abanarem como quem abana uma pitangueira carregada de pitangas. E o apelo a áfrica lembra uma limonada. Duas limonadas.
Aqui não, apesar de ser uma esplanada bonita. Simpática sim. E recente. Isso é que foi bem feito. Devia haver mais. Bem na praça, com o tejo a saudar quem está, quem passa, quem fica e quem parte.
Aqui não? Porque não? Estou de férias. Porque não? Levam-nos couro e cabelo. Que se lixe. Se não experimentarmos nunca o saberemos. Está uma brisa amena, debaixo dos chapéus brancos, novos e limpos. Nas mesas, não em todas, um vaso de manjerico. Eu quero uma mesa com um manjerico, para lhe tocar e cheirar a seguir.
Ai os manjericos da minha mãe...do quintal da casa nº162. Não é a casa nº126. Essa é a casa que tinha as mangueiras, goiabeiras, pitangueiras, fruta-pinha ,um mamoeiro, o tanque dos peixes vermelhos e lesmas passeando-se nas manhãs de cacimbo. E à noite, morcegos de volta das mangas maduras que caiam para cima do telhado. Bem sei que parece a mesma, mas o número está trocado. Eu não. Na casa dos manjericos, o número de porta era o 162. E não tinha só manjericos. Tinha cristas de galo também. Um macaco, herança do Sr. Praça, antigo rendeiro, fazendeiro de café, no mato, e comerciante na cidade, que se mudou para o Bairro Operário, pertinho da igreja de s. paulo. No 162, havia também um pombal com pombos anilhados. E uma hortinha com abóboras tão grandes que eu não podia com elas. E tomates. Grandes e redondos. E salsa e hortelã. E couves. Daquelas que cresciam, cresciam e davam uma flores amarelas.
Porque raio me lembrei da horta se o que eu queria era cheirar o manjerico da mesa onde me sentei para beber uma limonada... Uma limonada? Mais de 2 quilos de limões, não, de limas, que são mais caras. E dois ou três pacotes de quilo de açúcar e mais de um garrafão de cinco litos de água do luso. Ah, mas tinha o manjerico na mesa. Para lhe tocar de mansinho e depois cheirar. Ah... e tinha uma mesa mesmo atrás de mim com meia dúzia de pessoas, género masculino e feminino que diziam palavrões daqueles que nunca imaginei que algum dia pudessem ser ditos assim, de graça, numa conversa, entre gargalhadas, confidências e curiosidades. Ninguém estava ali para se zangar. Eu julgava que nós diziamos asneiras cabeludas quando estávamos pelos cabelos com uma situação, uma pessoa ou contra o F.M.I. Mas não. Não posso concluir isso, apenas pelo que eu faço.
Os tempos mudaram. As limonadas voltaram a estar na moda. Os miúdos, ( qualquer um ), quando não bebem álcool, gostam de beber uma limonada. É recente esta moda. Quando dei por isso até eu voltei a sentir o velho apelo ao sabor das limonadas que o pai fazia, não com limões grandes e de casca amarela, mas com limas, verdes e redondinhas, cortadas às rodelas, muito gelo e açúcar. Aqui, na esplanada da praça, em frente ao rio, ( isto paga-se ), não bebemos uma limonada destas, pelo valor pedido, podiamos beber uma pipa de limonada do pai, feita com limas, que são mais caras. Mas de que me queixo eu, se me sentei numa mesa com um manjerico em frente ao rio numa praça tão só, mas tão nobre?
O vento na cara sabe bem, a limonada também e antes de sair hei-de ir ver como é, lá para dentro, no interior das arcadas. Há-de ser um luxo, Hei-de vê-lo, macacos me mordam que faz um calor tropical!
Até chegar às casas de banho atravesso a sala das refeições propriamente dita e gosto. Encantou-me o gosto da decoração. Com algum requinte e bastante beleza. Nada que iniba um ser como eu, que pôe nódoas na roupa enquanto come, deixa cair o talher ou que tomba o copo, num desses azares de sexta-feira treze. Pelo contrário. Senti vontade de ficar para jantar. Não faço contas à vida, até porque a minha vida não é esta. Mas que gostava de perceber se é bom jantar neste lugar, gostava. A tarde está no fim. A limonada desapareceu, fiquei com o cheiro gostoso do manjerico, apesar dos santos já lá irem e despeço-me rapidamente do lugar. Olho os jovens da mesa de trás. Um deles olha para mim. Absolutamente normais. Tinham mudado o rumo da conversa e falavam com desprezo de um festival de música na Damaia. Elas muito mais críticas que eles. Há-de ter uma qualidade esse festival!!! diz uma. Eles é que lá tinham ido ouvir heavy metal. A Damaia é uma zona fixe. Os arredores é que são fatelas, diz ele na esperança de ser compreendido. Provavelmente arrependido de ter feito essa inconfidência.
Atravessei a rua e segui pela rua Augusta abaixo. Ou acima...

inequivocamente

foto tukayana.blogspot Não é o que parece!

curiosidades

foto tukayana.blogspot

Há cães com sorte!

fotografando
















foto tukayana.blogspot

beira-rio







fotos tukayana.blogspot

entre lisboa e cacilhas



















fotos tukayana.blogspot