Ofereço-te flores.
E beijos e abraços de parabéns.
E desejo muito que tenhas um dia bem passado. Que o comemores junto dos amigos e de alguma família que tens por perto.
Desejo-te tudo de bom como desejo para mim. Tu sabes.
Tinhamos o quê?! Catorze anos? Quando fomos da mesma turma do liceu?!...
Nunca mais me esqueci de te ver entrar na sala com uma bata branca diferente da nossa.
O logotipo duma cor um pouco mais esbatida e o branco menos branco. A textura também desigual. A nossa era de sarja. A tua parecia ser terylene. E abotoava atrás. Era uma bata muito ao lado da que exigiam.
Leram o regulamento interno do liceu, como o faziam todos os anos. Para ti era novo. Era o primeiro ano que frequentavas o liceu feminino. Não nos conhecias. Lembro-me de ti bem desconfiada.
Recordo-me da professora te chamar a atenção por causa da bata. Duma forma muito nazi. Simpatizei de imediato contigo. Não por ti. Por ela. Porque não gostava de ver alguém ser maltratado. Exposta perante uma turma inteira de alunas que já se conheciam de outras turmas e outros anos. Tinhas caído ali de pára-quedas e devias sentir-te muito diminuída. Eu sei bem como era aquela selva, naquele tempo. Ou lutavas por um lugar ao sol e eras chefe ou sub-chefe de turma e conquistavas um lugar de superioridade ou eras simpática, contavas anedotas ou fantasias que até inventavas,e tinhas também o tal lugar diferente e que te distinguia, ou eras barra, aluna de quadro de honra, ou então eras pisada, engolida.
Vivias na Vila Alice. Na rua da Churrasqueira, do " lugar " da Sãozinha, da loja do Adérito ( amigo do meu pai ) que eu conhecia muito bem. Que ia dar à loja pintada de cor de vinho, que vendia gelados de covetes, com um palito e sabor a groselha, na Senado da Câmara. Vivias com os teus imãos mais novos e junto dos irmãos mais velhos, cônjuges e sobrinhos de quem cuidavas, juntamente com os irmãos mais novos. Passamos a ir juntas umas por outras, liceu, casa, casa, liceu. Gostávamos dum canção que cantávamos e que nos fazia chorar " Angélita ", cantada em espanhol. Lembras-te?
Passava na tua rua e parava na tua porta para conversarmos, fora do período escolar. Quando deixamos de ser colegas, já éramos amigas. Do peito.
Foste estudar. Para a Escola de Enfermagem. Lembro-me que te acompanhei na primeira vez que ali foste. Depois ficaste interna. Encontrávamo-nos nas tuas folgas ou lá ou na avenida Brasil. Quando acabaste o curso e começaste a trabalhar no Hospital Maria Pia, na unidade de cuidados intensivos, quase não nos viamos. Depois separamo-nos. Mas o destino quis que viesses para minha casa. E procurássemos emprego para ti aqui. A primeira queda que dei neste país foi nas escadas da casa de Saúde, depois de ir pedir emprego para ti ao Dr. Carvalho e ao Dr. Bento, responsáveis e donos da referida Casa de Saúde. O Dr. Carvalho arranjou-te emprego. No Hospital do Entroncamento. Assim, sem sabermos ler nem, escrever, sem nunca nos ter visto. Como foram bons esses tempos. Estávamos sempre juntas. Mas o Entroncamento era pequeno para ti e partiste para Coimbra. Depois para o hospital de Sintra. Eu e a Milú visitamos-te em Sintra e foi a 1ª vez que fomos à Piriquita comer os tais pastéis tão afamados. Como vai longe esse tempo Julieta...
Mas não ficaste em Sintra. Passaste para S. José, em Lisboa. Também aí te visitei algumas vezes. De vez em quando vinhas a Torres Novas passar os fins de semana connosco.
Ainda não estavas em casa. Procuraste o caminho de casa toda a vida. E aventureira como és, partiste para a Suiça. Primeiro Lausanne e depois Genéve, onde estás.
A última vez que estivemos juntas foi em Genéve e tenho saudades. De ti. Sobretudo de ti.
Tu és especial. Um dia, nos meus anos, e não foi há muitos anos, acordaste-me às 5 da manhã para me dares os parabéns. E eu fiquei feliz. Parece estranho para quem saiba disto, para mim não, tu és assim. Quando fui ter contigo a Genéve, recomendei-te que chegasses a horas porque nem queria imaginar-me no aeroporto sozinha sem saber como chegar a ti. Ah sim, vou estar lá antes da hora. Pois o que é que aconteceu? Chegaste nas calmas, passados 20 minutos, seguramente.
Temos um episódio hilariante dos primeiros tempos de Portugal, quando vieste para t.novas para passares uns tempos connosco. Estávamos no quarto prontas para dormirmos. Várias. Para além de nós e da caçula, 3 primas filhas de um tio que viera de Moçambique. Para que não ouvissem as nossas conversas e porque estávamos às escuras, quiseste falar-me ao ouvido e sussurraste: Onde é que está a tua orelha? Eu pedi-te a tua mão para te orientares no escuro mas quis pregar-te uma partida e desviei-a. Foi tão patético, tão nojento, tão divertido que rimos à gargalhada perante a hipótese de me falares, em segredo, mas não ao ouvido. E as primas, as ricas primas furiosas pela nossa diversão, ameaçavam chamar os meus pais. Ainda hoje nos rimos deste episódio louco que nunca esquecemos e que é indicador da intimidade que nos une.
Dissete-me algo, que me emocionou muito, quando estive contigo em Genéve. E de que não me lembrava, mas tu, amiga, nunca mais esqueceste.
Que ao chegares a Lisboa vinda de Angola, em 1975 e me teres escrito, contando que estavas num hotel, pelo IARN e que não tinhas colocação, nem sabias o que fazer, eu te respondi: Vem para a minha casa. Falei com os meus pais e eles dizem que venhas. Vamos todos gostar que fiques connosco.
A amizade é isto, minha querida. Também(?) te devo umas e outras.
Hoje, gostava de te olhar nos olhos, bem de frente e dizer-te que sou feliz por seres minha amiga. Que te respeito muito. Que desejo que sejas feliz.
Gosto muito de ti Julieta e um dia, um dia vamos as duas tomar conta dos " teus " meninos, para Luanda. Esses meninos que a Fundação recolhe e cuida já. E outros e mais outros. Um dia o sonho de ver meninos de rua e desprotegidos crescerem com educação, instrução e amor tornar-se-á uma realidade bonita. Vais ver. Tu começaste, e se depender de mim eu vou fazer de tudo para te acompanhar.
Um bom dia de aniversário. Já tens 55 como eu, mas és uma menina formosa e bonita. Alegre e amiga. Parabéns e bebe uma taça de champanhe por mim.Tchim, tchim...
quarta-feira, 15 de setembro de 2010
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário