Chegou até mim, uma mulher vestida de negro. Apenas um cachecol cinzento com uns fios prateados tentava iluminar-lhe o rosto rugoso, esguio e triste.
Ao balcão encontrava-se uma mulher de nacinalidade russa. Loira, olhos azuis, bonita. Dois anos mais velha que eu.
Olhei as duas mulheres. Tão diferentes e tão iguais. A russa esperava que eu tratasse do seu assunto. Enquanto introduzia os dados no computador perguntava-me porque uma mulher de 57 anos deixa a Rússia para viver em Portugal tão precariamente, tendo como documento um título de residência temporária.
Há vidas assim. Recomeçando no outono da vida. Há destinos que se procuram ou não há como se lhes fugir.
A mulher de negro disse-me que tinha muita pressa.
Chegara depois. Teria de esperar pela sua vez. Soube porém o que queria e que dali iria para um hospital próximo. Não sabia se ficaria internada.
Expliquei-lhe que podia pedir a alguém que fosse ali. - Quem, menina? Sou sozinha. O meu marido é que me valia. Morreu...
A mulher russa olhou para ela e eu que estava de frente olhei-a também, nos olhos. Acho que só nesse momento a vi realmente.
Não sei se foi por a olharmos, se porque trazia as lágriams penduradas, talvez desde a morte do marido, que sei eu, sei que se soltaram grossas, deslizando pelo carreiro de rugas do seu rosto, num pranto sentido e infeliz.
Ao balcão do local onde ganho a vida, senti-me tão próxima das duas mulheres que atendi quase que em simultâneo, que pude chorar as lágrimas de uma e as angústias de outra.
A solidão do inverno da vida há-de ser muito difícil. Tal como começar de novo. E isso, eu sei como é.
Hoje entristeci...
Sem comentários:
Enviar um comentário