quinta-feira, 10 de junho de 2010

Uma vez sem exemplo


Disseram-me que havia um espaço de restauração, novo. Onde podiamos jantar. Nos jantares de quarta-feira. "Parece que só fazem bifes. E entradas muito boas. " " Tá bem, vamos lá então ".
O espaço é por demais conhecido. Noutros tempos, foi um bar, pub ou seja lá o que foi, que nunca percebi muito bem. Sei sim que era frequentado maioritariamente por jovens, filhos dos chamados " queques " da cidade do Almonda. Também os havia. Os filhos eram os ditos " betinhos ". Mas estes levavam amigos que não o eram e ficava um ambiente misturado que agradava a uns e outros. A tal mestiçagem que é necessária. Diria mais, imprescindível.
Chegadas ao local, percebi a dinâmica do espaço rapidamente. E gostei. Com duas salas, a das refeições e a do bar onde se bebem uns copos, se ouve música e se faz o que se faz em locais assim como estes. O que nos dá na real gana dentro das regras impostas e que nos impomos.
Um ambiente agradável a fazer lembrar os restaurantes do Bairro Alto, exceptuando as quintas-feiras. Um espaço velho mas com mesas redondas, outras quadradas, poucas, e cadeiras de realizador. As toalhas brancas. A televisão num canal que passava tourada. Estamos no Ribatejo. A poucos quilómetros da Golegã. Golegã, cavalos, cavalos, cavaleiros, cavaleiros, agro-betos.
Esta a designação para as pessoas que se demarcam do povo rural, sem deixarem de ser agricultores. Proprietários de quintas ou ex-quintas. Ou ex-proprietários. Ou ex-bem. Mas com a pose disto tudo. Cheiram a queques, betos, agro-betos à distância. Conhecem-se. Não há como não os conhecermos. Antigamente era a samarra e a botinha de tacão de prateleira. Hoje já não. Têm outras características, comuns à comunidade queque e beta. Eu bato com o meu olhar num qualquer e sei de imediato que pertence a esta espécie.
Mas não é um olhar crítico. Acostumei-me à diferença entre pessoas. Quando cheguei de Angola, não. Foi um choque, hoje estou vacinada. A hipocrisia quer queiramos ou não instala-se pelo desejo de sobrevivência num espaço que não nos é favorável et voilá, quando nos damos conta já adquirimos alguns tiques que vistos de fora, nos confundem, pela semelhança.
Bem, o restaurante novo estava à pinha. De queques. Só. Conheço-os a todos. Há muito não os via. Falo com alguns. O Amora, ex-perito médico do tribunal da comarca, filho do Dr. Amora, homem muito estimado que foi na cidade e arredores, a irmã, as amigas da irmã, o Sottomayor, uma joía de rapaz, advogado, com quem privo por força da profissão, os sócios do escritório, gente da Golegã e muitos mais.
Foi-me perguntado: Porque é que são todos assim?
Parecidos...do mesmo jeito. Os mesmos cabelos e penteados. As mesmas roupas. A mesma pronúnica. O mesmo tom de voz. O tratamento por você...até com os filhos. Os mesmos olhares...
Ora aí é que a porca torce o rabo.
É que eles, nesta terra estão em extinção, porque os comuns mortais deram filhos que são como os seus filhos e a mestiçagem passou a existir. Já não têm muita razão de persistir e então assiste-se ao declínio e agonia de uma espécie que desesperadamente ainda tenta cunhar a sua passagem. E ainda olham altivamente. Não para mim que me conhecem bem.
Detenho-me a falar neles pelo fenómeno, claro, apenas por estudo sociológico, eu que nem sou formada em sociologia, mas pronto...sei que já ocupam pouco terreno.
Fiquei com a idéia que o restaurante onde jantei pretende ser uma extensão do Clube da cidade, instalado há mais de 600 anos na Praça 5 de Outubro e com a frequência exclusiva dos dinossauros...queques, e dos rebentos betinhos, com entrada muito condicionada. Conheço o Clube mas é um espaço que nunca me interessou como não me interessa a betice que por lá tristemente se pavoneia.
Mas vamos ao que interessa que eu fui ali para jantar e conversar com a minha caçula.
Descobri que para além do bife da vazia com batatas fritas e só, também faziam francesinhas. Ora bem. Eu, que sou da plebe, adoro uma francesinha e na falta de estar num qualquer boteco do Porto comendo a melhor francesinha do mundo e arredores, arrisco. Na mesa do Amora comiam-se as ditas. Tinham bom aspecto e os olhos também comem. Oh se comem!
Mas foram só os olhos. O bife da minha acompanhante era mínimo e as batatas uma vergonha. Sobretudo porque eu sei que ela tem dentes até às orelhas e gosta de comer.
A minha francesinha sabia demasiada a cerveja. Foi a pior francesinha que comi na vida.
De sobremesa só tinham sorvetes. Não quis. Ela pediu. Eu desconfiei. Quando chegou olhei-a e só não dei uma gargalhada de imediato porque não fui ali para gargalhar para um sorvete anão e que não era meu. Mas ela, ela riu a bom rir com o meu olhar e com o meu " nossa senhora! ".
Estivemos a rir um bom bocado. O que valeu é que este povo refinado tem o umbigo tão grande que nem dá por nós, o que se torna vantajoso.
Para pagar, tive que ir ao multibanco mais perto, que fica a cerca de 200 metros, vá lá, mas estava a chover e não tinha chapéu. Já perceberam que ali se paga com dinheiro vivo. Espertos.
O el cantante na horinha, não vá o mundo acabar de repente...
Como já perceberam, não gostei especialmente do restaurante novo. Não por causa de quem o frequenta mas porque apesar do espaço mais ou menos agradável, a comida deixou muito a desejar e depois...o Sr. Vítor e o Alfredo são gente como eu gosto. Não, não serei cliente.
Vou voltar à " Tasca " porque ali sinto-me em casa de amigos com o paladar duma cozinha que sem ser pretenciosa é requintada e saborosa.
Esta saída não chegou a ser uma alternativa. Foi um devaneio gastronómico que não valeu.
E eu sou fiel a quem merece e me merece.

3 comentários:

Anónimo disse...

pelos vistos o teu colesterol tá bom......pra mim seria uma bomba..depois só com 5 litros de brututu....

Maria Clara disse...

Oh! Sabes lá como estão os meus interiores desde este dia...menina, não me deixei ficar por aqui. Ele foram cerejas aos quilos, laranjas, queijo da Serra etc etc, isto ontem na adega e quintarola da mãe da amiga Manuela...Hoje estou mali, mali. Isto tem de acabar, porque senão quem acaba sou eu doente da vesicula, do intestino, enfim! Não há juízo nenhum. E amanhã véspera de Santo antónio Lá vou eu a caminho das sardinhas.

Anónimo disse...

kem me dera tar aí para as sardinhas......