sexta-feira, 4 de junho de 2010

parar o tempo

Ontem foi feriado. Dia de Corpo de Deus.
Hoje continua a ser feriado, e amanhã e depois...
A temperatura está boa. O sol que eu chamei todo o inverno chuvoso, está quente. A escaldar.
A fazer lembrar férias e praia. Toalha estendida. Saco que tem de ser grande, como eu. Um biquini a mais, para o que der e vier. A parte de baixo, pelo menos. Mp3, mola do cabelo, escova, saco com água, maçãs, livro, caderno, caneta, máquina fotográfica, pilhas, lenços de papel, óculos de sol, porta moedas, passe de metro, cartão multibanco, protector que acaba não sendo usado, eu sei, eu sei que faço mal, que mania de quererem ser mãezinhas e paizinhos, façam o que eu digo, não façam o que eu faço. Tudo a postos para uma manhã, uma tarde ou um dia na Linha ou na Costa. Eu e eu, sós. Eventualmente outra pessoa ou ainda outra. Chega. Gosto que seja assim. Dou um mergulho e viro-me para terra. Espiando a minha toalha. O inconveniente de estar sozinha...
Quando começo a cantarolar, estou no ponto. Relaxei. A temperatura da água está boa e brinco sozinha chapinhando e dando umas braçadas sem sair do pé. De costas, de barriga, como o Borges da Cunha, o amigo do Ford Capri, me ensinou, ali na praia em frente da Floresta, na Ilha.
Volto para a toalha e prossigo os meus rituais de banhista, adquiridos quando passei a ir para a praia por minha conta e risco.
Os africanos, carregados de saias, vestidos, saídas de praias, um cem número de bugigangas, insistentemente me abordam mas eu resisto. Quase nunca faço negócio à beira mar.
Os homens das tatuagens, acham-me com cara, quer dizer, com corpo para tatuar e até se ajoelham para que eu escolha a tatuagem. Confesso que...há uma parte do corpo que fica tapadinha, que até nem me importava de ver, e teria que ver com espelho, com uma bonita tatuagem. Só para ter...esta mania de ser atrevida.
Também há os engraçadinhos. Aqueles que têm mais de quarenta anos com ares de antigos jogadores de futebol que batem a bola sozinhos, e que estão sozinhos, e de vez em quando " distraidamente " mandam a dita bolinha para junto da toalha e depois, ah que desculpe, que incomodei, que não volta a acontecer e tal e coiso, com um sorriso meio viscoso que me faz sempre uma náusea que ultrapassa essa coisa da pele e é muito visceral e incontrolável e devo ficar com cara de vómito porque não volta mesmo a acontecer e até se viram de costas ou se tornam invisíveis, que até dá pena.
Também há as criancinhas. Que passam a correr entre o saco e a toalha. Ou que atravessam a toalha se eu não estiver deitada. Ou que choram baba e ranho por um gelado, porque têm a fralda suja, porque querem ir para a água ou porque são embirrantes.
Em suma, é o sol, é o mar, é a onda e a areia. É o tempo quente. Cheirando a férias e a vida.
Mas ainda não fui fazer o gostinho ao dedo. E tenho quatro dias de férias. Essa é que é essa!
Ontem, troquei o sol, pela sombra.
Uma verdadeira sombra da mulemba...e aproveitei-a e sentia-a até ao fim. Que essa sombra nem sempre faz aqui, porque a mulemba é árvore da minha terra e só os angolanos conseguem recebê-la mesmo longe. E cantei e dancei e me banhei de lembranças. E dá para recomeçar a caminhada.
Ontem, troquei o sol pela sombra e fá-lo-ei sempre que me for oferecido um baloiço para eu baloiçar na sombra da mulemba, parando o tempo e ninando os afectos do meu coração e as minhas memórias e conciliando o passado com o presente para esperar o futuro.

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