Ontem, ao fim da tarde, namorei as minhas cerejas, por nascerem, por vermelharem. Por meterem cobiça aos melros que hão-de aparecer. Ainda de branco vestidas.
E num tratamento íntimo como só quem adora, sabe ter, olhei-as, uma por uma, advinhando-lhes os contornos redondos, carnudos, cheirosos e coloridos, que a cada ano, as minhas cerejas nessas formas provocadoras, me fazem crescer água na boca. Em outros anos, outras árvores, as minhas cerejas podem aparecer no fim de Abril. Mas estas, não. Vou esperar Maio, o mês das flores e de Maria.
Tomara que os melros perdessem a memória dos quintais. Deste quintal amigo, em que me detenho. E subo à árvore. Na escada que fica ali à espera de mim e dos outros, porque não sou única.
Ser amigo é, também, comer cerejas nos fins de tarde, quando as rãs coaxam, as osgas se passeiam nas paredes, o gato ronrona e a criança anda de baloiço, enquanto os donos do quintal se balanceiam na rede amarrada noutras árvores que morrem de inveja da cerejeira.
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