domingo, 7 de novembro de 2010

resgate

Se me querem ver feliz deixem-me estar com os amigos. A kamba do peito ligou. Tinha ligado quando eu acabara de chegar a Lisboa vinda de Torres Novas, porque ontem não tive coragem de pôr as pernas ao caminho. Sentia a traiçoeira da doença a aproximar-se, mas afinal, arrepiou caminho que eu ando por montes e vales e estradas a perder de vista e a doença nem sempre tem pedalada para me acompanhar.
A kamba deu-me conta das últimas novidades. Caiu a chamada. Ligou quando eu estava a almoçar lá para os lados de Santa Apolónia, num cuidado de pegar ao colo como ela sabe fazer. Dizendo-me que estava a passar em frente à minha casa, para o caso de eu querer ir com eles. E ligou de novo, já noite. As férias da minha kamba estão a chegar ao fim e temos de queimar os últimos cartuchos. E somos exactamente como éramos nos tempos idos de meninas e moças, nesta vontade de estarmos juntas. Parece somos kanucas.
Deu-me um recado em tom de ultimatum. Outra kamba ligara para convidar para jantar e deixara o recado: Traz a clara. Enterneceu-me. E aceitei, porque raramente me nego. Não a jantares. Pode ser um chá, um café, uma coca-cola, uma água. Mas, a viver momentos impagáveis como são os do prazer de estarmos junto de pessoas que gostam de nós. De quem gostamos. E quando são pessoas com quem partilhàmos a turma, os corredores do liceu, os caminhos que nos levam à escola e nos trazem para casa, as músicas e os intervalos, bem como as confidências, então aí, nesse lugar da amizade que abraça a adolescência, num abraço maior do que o universo, esse resgate, não perdemos de maneira nenhuma. Não eu.
Enquanto conversava com a cria mais nova, ai monami, ai monami querido que me vais deixar de novo numa respiração a um pulmão só, tocou o telefone.
" Olá amiga ".
Não reconheci o sotaque, apesar de ser o da nguimbi. Sotaque do meu kimbo eu conheço demais. Mas a voz não. Passei em revista todas as possibilidades. Insisti.
" Estivemos juntas no Cascais Shoping ", disse. Fez-se luz. Um dia, há alguns anos, de companhia com a minha kamba do peito, encontràmos a Beatriz, que estava cá de férias. Colega de ambas também da turma, do Liceu Feminino.
A Beatriz perguntara por mim. E ligou. E disse-me ter cama e mesa para mim, em Luanda. No Cacuaco, para onde se mudará dentro em breve. E foi tão bom ouvi-la. Tenho mesmo cama e mesa e abraço amigo, isso eu não tenho a menor dúvida." Não te quero roubar da Milú, mas vais ter de ter tempo para ficares na minha casa..." . Prometi que ligarei quando chegar a Luanda. Para nos encontrarmos e estarmos juntas.
São os angolanos. São as amizades de Angola.
São os afectos há três semanas seguidas marcando encontro aos sábados. Com o mesmo denominador comum. Angola.
O meu kamba, dono do pé sedutor e sensual, que apaixonou a minha kamba, e que hoje embarca para Luanda, quando me veio deixar a casa, abraçou-me e disse-me: Então até Dezembro, vamos farrar bué na passagem de ano ".
O meu coração rejubilou. Estou com kambas, estou com Deus.

2 comentários:

constancia disse...

Está quase, não é Clarinha? Beijinho

Maria Clara disse...

Falta o quase. Que é o mais difícil.
beijos