quarta-feira, 2 de março de 2011

a notícia que ninguém gosta de saber

Hoje é quarta-feira.
As minhas quartas-feiras à noite, que podiam ser à terça ou à quinta, nunca mais serão como antes.
Como a última...
Tocou o telefone na secretária. A Mena atendeu.
- Clara, é para ti.
Estranhei que logo pela manhã me quisessem falar para o serviço. Uma cria está a Norte. Outra na capital. A caçula está aqui pertinho e o mano Zé também. E o telemóvel não tocou.
Uma vez, há três anos e tal, tocou o telefone do serviço e eu atendi. E era a minha caçula. A chorar e a dizer - Mana, o Paulo está a morrer. E eu senti o coração a disparar, um calor no estômago e um gelo no corpo, o chão a faltar-me nos pés e a cabeça à roda. E um vómito.
E nunca mais esqueci nem voltei a ter uma boa relação com o telefone fixo. O do tribunal ou mesmo o de casa.
Estiquei o braço e olhei para o visor. Era a caçula. Senti o coração a bater mais rápido. O estômago quente.
- Mana? Sabes quem morreu?
Não respondi logo. Respirei fundo mas a vista toldou-se na mesma. Tive medo. Muito medo.
Ela prosseguiu. - Não vais acreditar.
- Quem? perguntei apavorada, dando uma volta pelas pessoas que a caçula sabe que me poderia provocar dano, a fatalidade de partirem para sempre. E continuei assustada.
- Nem consigo acreditar.
- Quem, Paula?
O momento era assustador e era preciso torná-lo mais breve. Acabar com a minha angústia.
- O sr. Vítor. O sr. Vítor da " Tasca ". Ainda ontem lá estive e disse-lhe que iamos lá hoje. Estive a falar com ele ontem à noite e hoje...como é que pode ser?
A caçula estava em estado de choque. E eu...
Vi diante de mim o rosto do sr. Vítor. O lugar onde o encontro sempre às quartas-feiras, que pode ser qualquer dia da semana menos ao domingo, porque o seu restaurante encerra aos domingos. As palavras, o sorriso, o cuidado que tem connosco, as brincadeiras que faz ao meu perfume, o enlevo perante as fotografias dos netos, as perguntas sobre a minha viagem a Angola, sobre as melhoras do Paulo,...sobre tudo ou qualquer coisa.
E fiquei num enjôo, transformado em vómito, que conheço bem de outras circunstâncias mas com as mesmas notícias.
O sr. Vítor partiu de repente. Pela noite alta. Sem avisar. Deixando todos estupefactos, assustados, tristes.
Hoje era dia de jantar na sua casa.
Partiu uma boa pessoa. Que me é próxima. De quem eu gosto.
Só me ocorre dizer que o sr. Vítor faz-me falta. E partiu cedo demais.
Hoje empobreci mais um pouco...

4 comentários:

nuno medon disse...

olá! se morreu, deveria ter morrido de enfarte repentino...digo eu. É sempre triste, quando morre alguém, ainda para mais, quanto menos se espera. Depois do almoço, costumo ir sempre beber um pingo, ao café. Um dono de uma tasca, ia todos os dias ao café e há menos de um mês, o dono do café disse-me que ele tinha morrido. Não falava muito com o senhor, mas fiquei triste. Era costume ver o senhor, quase todos os dias. Bastam uns segundos, para se morrer, para um avc, enfarte serem fatais. O senhor aparentava estar bem... mas sim, custa atender o telefone, para receber notícias tristes. beijos

constancia disse...

Até para quem acompanha o teu Blog o Sr. Vítor já era conhecido. É isto a vida, que rapidamente se transforma na sua ausência.
É como tu dizes amiga, são notícias que ninguém quer dar nem receber.
Bjs

milú disse...

faço minhas as palavras da Constancia....o Sr. Victor também já era nosso conhecido.....
calma e coragem amiga,é a lei inevitável da vida......
não chores pelo kperdeste, alegra-te por teres convividocom ele....

Maria Clara disse...

Obrigada.

O sr. Vítor fazia parte deste blog.
Vocês, minhas amigas sabiam que era importante para mim, para as minhas 4ªs feiras.
Hoje morreu a rotina das minhas 4ªs feiras e da caçula.
Hoje morreu um pouco de nós também e nada será como antes.
Foi um privilégio conviver com este homem, com mais intimidade nos últimos anos, embora o conheça à mais de 30 anos.
Era uma alma simples, boa e cheia de humor. Educado e galante.
Está difícil...