Ao domingo de manhã, o metro assume uma postura completamente diferente da semana e das noites de fim de semana.
Os passageiros, de todas as idades, cor, género e nacionalidades não o lotam mas dão uma riqueza imensa à viagem. Isto para quem para além de viajar, observa e questiona. Não há dúvida que quem usa o metro ao fim de semana não usa ou não tem transporte próprio, ( o porquê é claro como a água ), não são da cidade e da periferia. Ou são turistas.
Estes emprestam a este meio de transporte uma alegria e coloridos que apenas emudecem quando os cegos atravessam as carruagens, fazendo o peditório habitual e que já não surpreende o habitué das topeiras rápidas da cidade de Lisboa, mas cala de constrangimento. Quem sabe, de culpa...
Num assumir o que o Estado devia prevenir e resolver.
Neste outono disfarçado de verão dos trópicos, os turistas gozam os dias quentes desta cidade fantástica e é vê-los, empunhando máquinas, câmaras, mochilas. E há também os outros. Como eu. E d'outros. Chineses, moldavos, brasileiros, ucranianos, romenos, africanos, paquistaneses, indianos.
Uma menina indiana, sentou-se à minha frente. Quer dizer, eu acho que são indianos todos os que têm olhos pretos, pele de chocolate, cabelos lisos, negros, sinais na testa, vestes de tecidos finíssimos e padrões que me parece virem da Índia, seja ela qual. Peço desculpa pela ignorância, mas todos os que têm estas características, mais coisa menos coisa, são indianos, cheiram mais ou menos a tabu, óleos adocicados e especiarias e fazem-me lembrar caril de gambas e filmes musicais com o protagonista chorando d' amores por ela e fazendo-lhe declarações d'amor do alto duma montanha e ela, a donzela, respondendo no topo de outra.
A menina indiana olhou-me sem sorrir e eu olhei-a. Nos olhos. Uma da outra. Os delas mais escuros que os meus e mais enigmáticos. Tirou-me a fotografia. Olhou cada pormenor de mim desde os fones à carteira, mãos, roupa e até para o pé esquerdo que marcava o compasso musical. Olhou simplesmente. Reconheço esse passar revista pelo outro. Porque o outro existe e está ali à nossa frente. Olhei-a a dizer-lhe, tá-se bem. Vou de viagem mas não angustiada. É um domingo diferente. Vou nas calmas. Hoje é dia de tocar à campainha e a porta abrir ao toque em forma de código que há muitos anos quatro criaturas instituiram como - O toque. Hoje, ( apeteceu-me dizer à menina indiana que estava ali à minha frente ), é um domingo que eu gosto e o tarrafal tem o nome de encontro com os afectos, numa paz santa.
Mas ela mantinha-se calada e linda na sua postura correcta, de costas direitas, vestes longas, piercing no nariz, cabelos negros e longos, olhos belíssimos e atitude tranquila, olhando-me.
Ao lado uns italianos falavam pelos cotovelos e mais adiante três raparigas caboverdianas exageravam nos decibeis, num crioulo da ilha de santiago.
Na estação de S. Sebastião ( a do Corte Inglês ) a menina indiana agarrou na mala, olhou-me de novo, levantou-se e saiu.
Depressa chegou a Praça de Espanha, estação onde uns benfiquistas, enfarpelados de vermelho e branco para um jogo, num sábado destes, fizeram a piadola de que estavam a chegar à estação de Atocha, o que fez os básicos rirem a bandeiras despregadas e a mim pensar que há com cada adepto, que valha-me deus nosso senhor, carneirinhos...
A minha estação era Jardim Zoológico e nela saí numa falta de pressa de ter ainda uma hora e não estar virada para o Colombo que é só umas estações mais adiante. Não sei o que se passa comigo que estou como aquelas pessoas que odeiam centros comerciais. Não vou. Na verdade fui com a Ana há umas semanas ao Dolce Vita mas porque me foi buscar a casa. E também fui ao Torres Shopping ( o de Torres ) porque me convidaram, e acabei a comprar velas de cheiro numa super loja para artigos para a casa que nem sequer conhecia.
Bilhete comprado, fui almoçar ao Jardim Zoológico. E quando acabava de o fazer, vejo a menina indiana que saira duas estações antes, na companhia de um indiano jovem também, sorrindo ambos para um gelado. Ia jurar que os olhos dela sorriram para os meus quando por mim passou. Eu sorri-lhe. Não sei se percebeu. Não era importante. Durante alguns minutos foi a minha companhia num metro que nem sempre é amistoso ao domingo. Por conta desses dias menores, apeteceu-me congelar o sorriso p'ra domingos de solidão.
Ele há coincidências!
Curiosamente, gosto de indianos. Não como se gosta de crianças e de cães. Nada disso. Se tivesse outra vida para viver depois desta, gostaria de ter outra pele. Ser indiana é uma pele que gostaria de vestir. Tenho atracção e paixão pela Índia, desde menina. Curiosamente, quando a minha primeira cria nasceu, o pessoal do hospital achava que era filha de indiano ( não é ). Ainda hoje parece ter vindo desse lado do globo.
Ele há mesmo coincidências!
terça-feira, 27 de setembro de 2011
ele há coincidências!
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